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domingo, 23 de dezembro de 2018

Não haverá Natal para os reclusos



sexta-feira, 21 de dezembro de 2018



Texto de Fernando Calado Rodrigues; Ilustração de Graça Morais para a Amnistia Internacional, nos 25 anos da organização

Os reclusos estão privados da assistência religiosa devido à greve dos guardas prisionais. Se a greve se estender até janeiro, como se prevê, então os reclusos não poderão ter a celebração eucarística de Natal.

Até 2014, a assistência religiosa fazia parte dos serviços mínimos a serem garantidos aos reclusos durante os períodos de greve. Com a aprovação do novo Estatuto do Pessoal do Corpo da Guarda Prisional, nesse ano, a assistência religiosa deixou de ser mencionada no artigo 15.º, que estabelece os serviços mínimos a serem garantidos. Passou então a ser vedado o acesso dos sacerdotes aos estabelecimentos prisionais durante as greves.

Logo nesse ano - quando uma greve privou os reclusos de celebrarem a Semana Santa e a Páscoa -, o Departamento da Área Jurídica da Coordenação Nacional da Pastoral Penitenciária, dependente da Conferência Episcopal Portuguesa, elaborou um parecer que concluía que "não pode nenhum cidadão privado de liberdade ser impedido de obter assistência religiosa, apenas e só pelo facto de, no momento em que necessita da mesma, se encontrar em curso uma greve do Corpo da Guarda Prisional".

Argumentava-se nesse parecer que "o direito a greve dos guardas prisionais não pode sobrepor-se ou coartar o direito a assistência religiosa por parte dos cidadãos privados de liberdade, uma vez que ambos são direitos com dignidade constitucional".

Na Constituição da República Portuguesa, ambos são referidos sob o título "Direitos, liberdades e garantias". O direito à greve é incluído no capítulo dos "Direitos, liberdades e garantias de participação política". A liberdade de consciência, de religião e de culto aparece entre os "Direitos, liberdades e garantias pessoais". Essas duas liberdades, tal como o respeito pela vida humana no artigo 24.º, são classificadas como "invioláveis" no artigo 41.º.

Ao não ser garantido o acesso ao culto por causa da greve, há uma norma constitucional que está a ser posta em causa. E isso sucede numa época tão significativa para a maioria da população reclusa como é o Natal!

Não se pede às organizações sindicais que não promovam greves em determinadas épocas, como é a natalícia ou a pascal: cada um gere os seus interesses como entende. Mas podem-se dizer três coisas. Primeira: exigir o direito integral dos reclusos à sua dignidade constitucional. Segunda: solicitar a revisão do Estatuto do Pessoal do Corpo da Guarda Prisional, por forma a suprir a ausência da assistência religiosa dos serviços mínimos, única forma de cumprir a Constituição. Terceira: apelar ao bom senso e ao reconhecimento que, nestas e noutras alturas do ano, mas sobretudo nestas, o ambiente prisional, já por si demasiado tenso, teria a ganhar com a presença do assistente espiritual e com a celebração do culto.

Para além de garantir um direito constitucional, de que os reclusos não podem ser privados, o acesso ao culto permite que muitos deles se sintam reconfortados pela assistência religiosa e a celebração da eucaristia.

(Texto publicado no Jornal de Notícias de 17 de Dezembro de 2018)




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