segunda-feira, 17 de dezembro de 2018
Texto de Maria Wilton
A descarbonizarão das fontes de energia é uma das medidas urgentes para tentar inverter os efeitos das alterações climáticas (foto Pixabay)
“Dizemos várias vezes que a situação do nosso planeta precisa de decisões para amanhã” disse monsenhor Bruno-Marie Duffé, chefe da delegação da Santa Sé na COP24, a Conferência do Clima que terminou no fim de semana, em Katowice, no sul da Polónia. “Mas amanhã é hoje. Amanhã é hoje.”
Foi este sentimento de urgência que marcou a Conferência sobre Alterações Climáticas, organizada pelas Nações Unidas para verificar o cumprimento do Acordo de Paris, de 2015.
Repetindo o alerta do Papa Francisco, de ouvir a voz da Terra e dos pobres, o padre Duffé pediu uma renovação de solidariedade global, por parte dos representantes de 200 governos do mundo presentes na conferência, incentivando-os a agir: “Temos que passar das intenções éticas acerca do clima e do futuro da vida na Terra para decisões financeiras e políticas.”
A conferência, que decorreu entre 3 e 14 de dezembro, pretendia reunir os países que integram o Acordo de Paris e delinear um “livro de regras” para o concretizar, já a partir de 2020.
Este guião cobre vários assuntos, como o modo de comunicar as emissões de gases com efeito de estufa e as regras que devem ser aplicadas ao mercado de emissões de carbono. O acordo define linhas mestras gerais para todos os países, deixando margem de manobra para os mais pobres, e usa linguagem legalmente mais vinculativa, trocando o deve indicativo (em inglês “should”) por um mais imperativo “irá” (“shall”).
No entanto, segundo diversos especialistas, o acordo ainda fica muito aquém do que foi delineado em 2015. Ao Carbon Brief, um site de informação com um foco ambiental, Joeri Rogelj, professor de alterações climáticas no Imperial College, em Londres, explicou uma das preocupações: “Sobre o Acordo de Paris, emissões e reduções de emissões propostas serão regularmente comparadas com os limites máximos de aquecimento estabelecidos: 2 e 1,5 graus Celsius (em relação à era pré-industrial). Mas, para fazer isto, o relatório não vai aderir a métodos científicos robustos mas sim deixar cada país usar a sua metodologia nacional – o que provavelmente levará os países a relatar cenários melhores do que eles realmente são.”
A falta de rigidez foi uma das críticas mais comuns tecidas às medidas que saíram da Conferência. Enquanto que o limite de aquecimento global tinha sido acordado nos 2 graus Celsius no Acordo de Paris, um relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) publicado em outubro, gerou tensão em Katovice ao dizer que este limite não seria suficiente.
(Foto Maria Wilton)
“Não podemos fazer um acordo com a ciência, nem negociar com as leis da física”, alertou Mohamed Nasheed, antigo Presidente das Maldivas, a falar em nome das pequenas ilhas e países vulneráveis que vêm o seu território ameaçado pela subida do nível dos oceanos. Os mesmos defendem que a sua sobrevivência depende de alterar o objetivo de 2 graus para 1,5 graus Celsius até 2020, algo que requereria uma mudança económica radical e uma rápida descarbonização.
Rebecca Elliott, diretora de comunicações do Movimento Católico Global pelo Clima, uma rede de mais de 650 organizações católicas, mostrou o seu apoio aos países em questão: “Além de agir como voz moral e oferecer uma resposta robusta em fé, as organizações católicas estão a recolher relatos de pessoas da América Latina, África, Índia e ilhas do Pacífico que estão a ser gravemente afetadas pelas alterações climáticas.”
Por parte da Christian Aid, organização missionária cristã britânica, Mohamed Adow, delegado internacional à conferência, mostrou-se descontente com o resultado final: “O facto de a maioria dos países ter de ser arrastado a gritar até à meta mostra que algumas nações não acordaram para o apelo urgente do IPCC. (…) Países como os Estados Unidos, a Arábia Saudita, a Rússia, a Austrália e o Brasil não vieram preparados para fazer aquilo que prometeram. Sem trabalhos de casa, as nações não vão resolver a crise climática.”
A mais forte e mais nova crítica
Os países chegaram a acordo mas algumas questões essenciais para combater as alterações climáticas, como o referido mercado de emissões de carbono, foram relegadas para a próxima conferência, no final de 2019, que terá lugar no Chile.
O encontro deste ano ficou marcado pela sensação de inércia dos governos de países abastados, algo que Greta Thunburg, ativista sueca de 15 anos, fez questão de salientar ao discursar perante durante os trabalhos.
A jovem, que se tornou a cara e a voz da Climate Justice Now, foi notícia em todo o mundo ao criticar líderes mundiais: “Apenas falam de crescimento económico sustentável porque têm medo de não ser populares. Apenas falam de andar para a frente com as mesmas más ideias que nos colocaram nesta confusão quando a decisão sensata é puxar o travão de emergência. Não são maduros suficientes para dizer as coisas como elas são. Até essa tarefa deixam para nós crianças. Mas eu não me interesso em ser popular. Interesso-me em justiça pelo clima e pelo planeta onde vivemos.”
Greta Thunburg salientou que não vinha implorar aos líderes mundiais por mudança porque, tal como estes apelos teriam sido ignorados no passado, seriam ignorados hoje: “Vim para dizer que as mudanças vêm aí, quer queiram quer não. O verdadeiro poder (de mudança) pertence às pessoas.”
O seu discurso, que se tornou viral nas redes sociais, está a ser comparado ao discurso de Severn Cullis-Suzuki na primeira Conferência do Clima, em 1992, no Rio de Janeiro (Brasil). A rapariga de 12 anos falou de desflorestação e fez um apelo semelhante a Greta: “Perder o meu futuro não é como perder uma eleição ou pontos na bolsa.”
(Informação detalhada sobre a COP24 pode ser consultada aqui e sobre os efeitos das alterações climáticas está disponível aqui.)
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