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domingo, 25 de dezembro de 2016

Deus e os gigantes da Ciência

Foi o físico inglês Isaac Newton quem afirmou, numa carta escrita em 1676: “Se consegui ver mais longe é porque estava aos ombros de gigantes”. O carácter cumulativo da ciência não podia ter sido melhor explicitado. Com efeito, sem os contributos dados pelo astrónomo polaco Nicolau Copérnico, pelo astrónomo alemão Johannes Kepler e pelo físico italiano Galileu Galilei, Newton não teria podido realizar a sua notável obra que unifica os movimentos no céu e os movimentos na Terra. E, sem conhecer bem todos esses contributos (como de muitos outros), o físico alemão Albert Einstein não poderia, mais tarde, ter alargado a nossa descrição do mundo.

Que visão tinham de Deus os referidos gigantes da ciência? A Revolução Científica, iniciada em 1543 com a publicação da teoria heliocêntrica de Copérnico, ocorreu no seio de uma Igreja que vivia tempos de convulsão devido à Reforma luterana. Lutero foi aliás um dos primeiros a ridicularizar as ideias científicas de Copérnico, que era cónego na catedral católica de Frauenburg. Tanto Kepler como Galileu foram ardorosos crentes. Kepler foi protestante, tendo começado por se preparar na Universidade de Tuebingen para uma carreira teológica. O seu contemporâneo Galileu foi católico, tendo estudado a doutrina da Igreja num mosteiro perto de Florença antes de ingressar como estudante na Universidade de Pisa. Kepler deu provas nos seus livros de um grande arrebatamento religioso, nalguns passos mesmo com um tom místico. E a fé de Galileu, relacionado de perto com a mais alta hierarquia da Igreja de Roma, não esmoreceu com a pena a que o Tribunal da Inquisição o condenou.

Newton era, por formação, anglicano. Tal como os gigantes a cujos ombros subiu, também ele estudou teologia. Para o sábio inglês não havia dúvidas de que o Universo era obra de Deus, iniciada na Criação e continuada depois. Porém, o seu pensamento religioso esteve longe de ser ortodoxo. Não aceitava a doutrina da Santíssima Trindade, defendendo antes que Deus era unipessoal. Teve de manter secreta essa posição até porque era membro do Trinity College na Universidade de Cambridge. E também manteve secretos alguns dos seus estudos sobre a Bíblia…

Einstein conseguiu, do ponto de vista religioso, ser ainda menos ortodoxo do que Newton. De ascendência judaica, nunca entrou contudo numa sinagoga para rezar. Não acreditava num Deus pessoal, tal como aparece na Bíblia, mas achava que o transcendente se encontrava na ordem misteriosa do mundo. O rabino de Nova Iorque perguntou-lhe um dia, por telegrama, se acreditava em Deus. E a resposta foi curta: “Acredito no Deus de Espinosa, que se revela na harmonia ordenada daquilo que existe, não num Deus que se preocupa com as acções dos seres humanos”.

Carlos Fiolhais, Heliosfera,
in Semanário O Sol de 21-4-2011




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