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sábado, 6 de fevereiro de 2016

Estado de alerta: pressentem-se no horizonte, novos/velhos ventos de “cultura da morte”...

Depois do “gigantesco retrocesso civilizacional” que significa a liberalização do aborto no espaço português, levado a efeito por uma minoria de 24% dos portugueses, eis que se levantam, mais uma vez, “vozes agoirentas”, “tenebrosas”, a sugerir a ampliação da cultura da morte, admitindo e/ou promovendo a eutanásia!

Onde nos situamos agora?!

A eutanásia, como todos sabemos, consiste numa prática através da qual se abrevia a vida de uma pessoa mais ou menos enferma, de maneira controlada e assistida por um especialista. Trata-se, no fundo, de uma “prática alternativa” aos imprescindíveis cuidados paliativos, que a dignidade da pessoa humana reclama e merece, como um dever grave de justiça, até ao momento sublime de uma morte natural que, essa sim, “é morrer com dignidade”...

A eutanásia representa uma complexa questão de bioética e de biodireito, uma vez que o primordial dever do Estado é a defesa e proteção da vida dos seus cidadãos.

A “eutanásia ativa” concretiza-se nas ações que têm por objetivo pôr termo à vida, na medida em que é planeada e negociada entre o doente e o profissional que vai realizar o ato.

A “eutanásia passiva” por sua vez, não provoca deliberadamente a morte, no entanto, com o passar do tempo, conjuntamente com a interrupção de todos ou de alguns cuidados médicos, farmacológicos ou outros, o doente acaba por falecer. São canceladas quaisquer ações que tenham por fim prolongar a vida. Não há, por isso, um ato que provoque a morte (tal como a eutanásia ativa), mas também não há nenhum que a impeça.

Vários estudos têm vindo a divulgar que a maior parte das pessoas que solicitam os atos próprios da eutanásia ativa não o faz pela dor física, mas por uma dor psicológica tratável. Isto demonstra o sentido de urgência da alteração do Serviço Nacional de Saúde, apetrechando-o de uma verdadeira e “humanizada” rede de cuidados paliativos, adequados, de forma personalizada, a cada situação.

É evidente que a maior parte ou a totalidade de alguns pedidos feitos pelos doentes poderiam ser evitados, se existissem os necessários cuidados paliativos e não o “abandono” desses doentes terminais...

A ficção da “decisão voluntária”
Sabemos todos por experiência real que o instinto mais forte da natureza humana é o instinto de conservação da vida.
   
E conhecemos atualmente que, na imensa maioria dos casos, o desejo de suicidar-se não é consequência de danos corporais e dores extremas, mas sim a expressão de se sentirem abandonados. A medicina paliativa tem feito tais progressos, que as dores são quase sempre controláveis, em qualquer estado de enfermidade e, felizmente, não atingem o umbral do insuportável. Na maior parte dos casos, também a dedicação intensiva daqueles que prestam cuidados modifica o desejo de suicídio, produzindo antes a consciencialização de que a “nossa vida”, afinal, continua a ser importante... O médico dedicado representa, junto do doente, a afirmação de que a sua existência continua a ser útil, apreciada e solidária...

É precisamente nas situações de fragilidade anímica que pode aparecer o desânimo do doente, momentâneo, normal, associado a manifestações de fuga do sofrimento, mas que no fundo, ama a vida, quer viver… 

São muitas as vozes que se têm atrevido a denunciar com firmeza, esses atropelos da dignidade humana. Atropelos que chegam por vezes a constituir uma autêntica cultura da morte que em todas as épocas se manifestou na morte legal de inocentes.

A história mostra-o com crueza no genocídio hebreu, nas limpezas étnicas de tantos conflitos bélicos, ou no mais subtil e solapado tirar a vida a seres humanos antes do seu nascimento, ou antes de atingirem a meta natural da morte.

São sempre os membros mais débeis da sociedade os que correm maior risco diante dessa perigosa manifestação de intolerância: as vítimas costumam ser os não nascidos (aborto e manipulações genéticas), as crianças (comércio de órgãos), os doentes e idosos (eutanásia), os pobres (abusivas imposições de controle demográfico), as minorias, os imigrantes e refugiados, etc.

Porque será que se tem imposto este erro no mundo, em tantas ocasiões? De onde provém o seu atrativo?!

O atrativo do erro não provém do mesmo erro, mas sim da verdade – grande ou pequena – que nele palpita. Por isso, um erro é tanto mais perigoso quanto mais verdade encobre.

E a modesta verdade que está subjacente na cultura da morte – a que esta deve ter emprestado o seu atrativo - é a mesquinha e malévola ambição (desfazer-se do ancião ou do enfermo incómodos, eliminar uma nova vida que nos parece inoportuna, melhorar a qualidade de vida dos que permanecemos com vida) que, satisfazendo fugaz e brevemente as paixões humanas, obscurece a inteligência até torná-la incapaz de perceber o erro que comete.

Detrás de uma máscara de tolerância, esconde-se a mais cruel e macabra prova de intolerância: a de não deixar viver o inocente.

Diante das crescentes possibilidades da medicina, esperamos que a deontologia médica desenvolva critérios de normalidade, critérios do que em justiça é devido a cada pessoa, e precisamente aos velhinhos e doentes, em dedicação, cuidados e assistência médica básica; assim como os critérios relacionados com a idade, as perspetivas de cura e as circunstâncias pessoais.

O desejo que brota do coração do homem diante do supremo encontro com o sofrimento e a morte, especialmente quando sente a tentação de cair no desespero, é sobretudo aspiração de companhia, de carinho de solidariedade e de apoio humano e espiritual adequado ao momento de provação. É petição de ajuda para continuar a esperar, quando todas as esperanças humanas se desvanecem…
 

Maria Helena Marques
Prof.ª  Ensino Secundário

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