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segunda-feira, 24 de abril de 2017

Golos e Alegrias

Residindo nas proximidades do Estádio da Luz, pode constatar-se como, em dias de jogo, o trânsito se torna lento, faltam lugares de estacionamento e vêem-se grupos numerosos de pessoas vestindo camisolas vermelhas, usando cachecóis listrados de vermelho e branco e exibindo bandeiras do seu clube. Tudo isto servirá para manifestar a alegria dos adeptos que, em momentos emocionantes, se manifestam também em altos brados. Cada golo é noticiado de forma sonora e com grande impulso e calor, qual bala projetada da boca de potente canhão. É uma festa!

No Domingo de Ramos, ouviram-se cânticos religiosos na zona da Luz. Passava a Procissão dos Ramos, como é costume nas aldeias. Era longa, ordenada e com muitos ramos de palmeiras transportados por quase todas as pessoas que dela participavam. Foi este o primeiro momento de uma alegria profunda que começou já em tempo quaresmal.
 
Uns dias depois, eram muitas as pessoas que esperavam vez para se confessar. Dei comigo a aproveitar o tempo de espera, diante do Santíssimo Sacramento, numa oração talvez um pouco irreverente. Parece-me que comecei bem ao louvar Deus e a Virgem Maria, neste ano do centenário das aparições de Fátima, por tantas pessoas se disporem a receber o sacramento da misericórdia nesta Quaresma. O pior aconteceu quando dei por mim a comparar esta alegria com a dos benfiquistas.
 
Era mais ou menos assim: a primeira, e enorme, alegria consistia no facto de a fé cristã, se levada de modo responsável, conduzir sempre à vitória que consiste em alcançar a glória eterna. Se acontecem os auto-golos (na própria baliza), são os pecados. O Baptismo, a Confissão, a Comunhão e o Matrimónio são os sacramentos comuns dos adeptos. Com bilhete, pode assistir-se ao jogo dentro do estádio e perto dos jogadores – com o Batismo, tornamo-nos filhos de Deus e parte da Igreja. Os verdadeiros apreciadores de futebol sempre dão uns pontapés na bola em jogos amigáveis; lesionam-se, desapontam quem torce pela sua equipa, mas tratam-se e treinam-se para melhorarem o seu desempenho. É um pouco o que acontece na confissão. Quem se confessa é mais do que um mero espectador, é alguém que cuida da saúde da sua alma, ouve os conselhos do “treinador”, esforça-se por chegar pontualmente. Quem usa caneleiras protege-se de pontapés, e os desinfectantes, ligaduras e pensos curam feridas, contusões e entorses. Na alma, os efeitos da Comunhão são semelhantes a estes: protegem-nos das tentações dando-nos forças para lutar contra elas e são-nos perdoados os pecados veniais. O Matrimónio assemelha-se ao contrato de entrar para uma equipa, embora pareça exagero chamar equipa ao projeto de duas pessoas. O valor da equipa, neste caso, não se confina ao número dos seus elementos, mas sim ao seu valor e à grandeza do projeto que é ilimitado em tempo, espaço e influência. O nome e a influência de uma família podem manter-se por séculos, em vários países e abrangendo várias realidades: descobertas de novos mundos, invenções, heroísmos, exemplos de santidade.
 
Poderíamos pensar acerca da disciplina e sacrifícios exigidos ao treinador e jogadores de primeira classe e compará-los com os sacramentos de serviço aos outros: a Confirmação e o Sacerdócio. Sem esquecer ainda a chegada à aposentação que, nos jogadores, costuma aparecer muito cedo. A Unção dos enfermos é um sacramento que se destina a confortar (alegria), encorajar e, sobretudo, fortalecer todos quantos estão em perigo de vida (por doença, guerra, missões de risco...), seja qual for a sua idade. Mas o tema que agora nos anima continua a ser a alegria, esse dom que nunca se perde em nenhuma “equipa”, pois qualquer “vitória” – conversão, mudança de vida, baptismo, acto de misericórdia, nova fundação, etc. – é uma ocasião de regozijo. Todas são “vitórias” de Cristo, do seu Corpo Místico que é a Igreja.
 
Não há golos, por mais numerosos e espetaculares que sejam que superem a profunda alegria de sermos as “botas” que marcam os golos divinos.

Isabel Vasco Costa



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