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segunda-feira, 10 de junho de 2013

Bao Yuanjin era ateu e comunista: Deus usou sonhos, vozes e sinais até fazê-lo padre clandestino


Via a falsidade do sistema adulador

Actualizado 17 de Maio de 2013

P. J. G. /ReL

Bao Yuanjin (não é o seu nome real) é um sacerdote clandestino na China.

Só há 20 anos que é cristão: antes de 1994 era ateu, estava sem baptizar e era membro do Partido Comunista. Contou o seu testemunho à agência AsiaNews há um tempo, como um testemunho do catolicismo que cresce na China por debaixo do radar do Partido.

Como todos, aulas de ateísmo no colégio
Bao não recebeu nenhuma formação cristã. Só tinha uma avó cristã, protestante, que uma vez em criança lhe disse que Jesus era o Filho de Deus. Nada mais. Ao pequeno Bao aquele tema não lhe interessava.

Como todos os chineses, recebeu as suas aulas obrigatórias de ateísmo, tanto na escola elementar como na universidade.

Sendo universitário, crer em Deus parecia-lhe algo infantil, "talvez inclusive um pouco estúpido", recorda.

No seu quarto curso na universidade inscreveu-se no Partido Comunista, algo que se costuma fazer para conseguir contactos que ajudem a encontrar trabalho e postos interessantes. Tinha que formar parte de uma célula de estudantes comunistas, com a missão de "ser bons com todos, estudiosos e bons organizando todo o tipo de actos".

Não soa como algo mau. Mas o sistema estava podre: "essas coisas não se faziam pelo bem dos demais, mas sim pelo próprio, para avançar na própria carreira. E estava enraizado na mentira".

Autocrítica, adulação e mentira
Não se podiam dizer as verdades, a adulação aos chefes imediatos era obrigatória.

Ainda que houvesse um espaço para praticar o que chamavam a "autocrítica", Bao recorda que consistia sobretudo em adular a algum chefe dizendo, por exemplo: "devo criticá-lo, senhor, por algo que você não fez bem: trabalha você demasiado por nós! O trabalho é importante, mas também a saúde, para poder continuar servindo à sociedade! Tem você que descansar, por favor".

"Às vezes uma voz no meu coração dizia: isto é tudo uma mentira, uma mentira, mas eu participava nisso", recorda.

Um estranho sonho... Com presente
Em certo momento, caiu enfermo. Pelas noites, começou a ter pesadelos que o despertavam. Uma noite, sonhou que encontrava um pacote. Abriu-o, e dentro havia um livro. "Era uma Bíblia, brilhante, resplandecente. Despertei-me. Recordei-me que a minha avó era a única pessoa que me tinha dito algo da Bíblia, e a recordei dizendo-me que Jesus era todo-poderoso. Pensei: se Jesus é todo-poderoso, talvez possa curar-me". E começou a ir a uma igreja protestante às escondidas.

Acabou a sua carreira e visitou a sua família, que vivia noutra região. Ali, no final da sua temporada de férias, um amigo ofereceu-lhe 10 cassetes com os sermões de um padre chinês. Escutou-os, e começou a pensar que talvez Deus existia, que a Igreja Católica tinha razão. Mas chocava com as suas aulas de ateísmo e com o perigo de meter-se em problemas se aceitava a fé.

Pedindo um acidente à Virgem!
Tinha que voltar à sua cidade. E pela primeira vez rezou, e o fez falando com a Virgem Maria: "Santa Maria, se existes e a fé católica é certa e queres que eu seja católico, dá-me um sinal; que amanhã, durante a viagem, me aconteça algo importante, um acidente talvez, ao qual sobreviva, e acreditarei".

Anos depois o padre Bao admitiria que era uma oração estúpida que tentava a Deus, "mas foi a única que me ocorreu então".

O caso é que, efectivamente, no dia seguinte o autocarro no qual ele viajava virou-se, sem mortos nem feridos, mas todos tiveram que sair do autocarro partindo as janelas.


Procissão da Virgem no santuário mariano
de Sheshan
Mas converteu-se Bao? Não: nem se recordava da sua promessa. Mas quando descobriu que com o atraso tinha ficado sem bilhetes de comboio e perderia três dias na estação e daria má imagem no seu trabalho, voltou a rezar à Virgem: "ajuda-me a encontrar um bilhete de comboio; se me ajudas esta vez, juro-te que te seguirei!".

Nesse momento apareceu um homem nas bilheteiras gritando: "Quem quer bilhetes para a cidade de Tal? São para hoje. Quem os quer comprar?" Era o que Bao necessitava, e comprou-os!

Católicos: gente simples, sem mentiras
Bao chegou à sua cidade, começou o seu novo trabalho... E começou a ir à missa às escondidas. Entre os católicos encontrou uma comunidade de gente "simples e boa, sem mentiras, com amigos reais. Era libertador para mim, já não tinha que mentir. Ali às pessoas se podia criticar, inclusive podias criticar o padre!". Uma liberdade e autenticidade muito diferente ao que conhecia.

Pensou baptizar-se, mas o padre disse-lhe que antes teria que abandonar o Partido. E isso era complicado de fazer. Era una renúncia directa, um significar-se. Escreveu uma carta pedindo deixar o Partido, mas não se atrevia a entrega-la. Quando por fim o fez, o oficial que a recebeu ficou sem palavras. "Era a primeira vez que via alguém recusar permanecer no Partido, estava completamente aturdido".

Bao baptizou-se: era 1994. E sentiu uma grande paz. Ia à missa a uma comunidade católica clandestina. Ali uma monja comentou-lhe se não queria ser sacerdote, mas ele tinha claro que não podia ser: como filho mais velho tinha que manter os seus pais quando fossem anciãos, algo impossível para um padre.

E ouviu uma Voz
Seis meses depois, estando em oração na sua habitação, "ouvi uma voz que me dizia SEGUE-ME. Não havia ninguém na sala. No meu coração, entendi que era Jesus que me chamava. Assustei-me, porque ser padre da igreja clandestina significava deixar tudo, deixar família, trabalho, pôr-me em risco, abraçar a Cruz, sofrimento, prisão..."

E disse "não". Tinha uma vida tranquila, bom trabalho. Disse não a seguir Jesus. Mas perdeu a paz, não tinha gozo nem alegria. E entendeu que não podia resistir à chamada de Deus.

Durante dois anos trabalhou duro, guardou uma quantidade para os seus pais, e logo entrou no seminário clandestino, uma casa no campo que um paroquiano deixava aos seminaristas. Quando a policia os descobria, tinham que procurar outra: em 5 anos mudaram três vezes de esconderijo.

Havia pouca comida, "poucos vegetais, quase nada de carne, habitações abarrotadas sem espaço". Mas estava contente.

"No meu coração sentia paz, um gozo inteiramente novo, diferente do que tivera sentido antes. Havia uma amizade forte e sentido de irmandade entre os seminaristas. Todos estávamos prestes a amar o outro e superar as dificuldades".

A Policia dorme: ordenação
Depois de 5 anos de estudos clandestinos, recebeu a ordenação numa cerimónia emocionante... Às 4 da madrugada! "É a hora na qual todos dormem na China, inclusive os polícias, porque havia alvoroço na diocese e arriscávamos-nos a que nos encarcerassem".

Durante estes anos viu o crescimento das comunidades católicas. Em 1983, quando a China começava as suas reformas económicas, só havia 3 famílias católicas na cidade. Vinte anos depois, em 2003, já havia 4.000 católicos nessa localidade. "Realmente, o sangue dos mártires é semente de cristãos", assegura o padre Bao.


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