Ataques sucedem-se
O recente ataque a um cristão falsamente acusado de ter queimado páginas do Corão, por uma multidão muçulmana enfurecida, no Paquistão, desencadeou “uma nova vaga de terror” contra a minoria religiosa no país. Depois deste incidente, que aconteceu no passado sábado, 25 de maio, já foram registados outros dois ataques devido a alegados atos de “blasfémia” por parte de cristãos.
A vítima do ataque de sábado foi Nazir Gill Masih, 74 anos, proprietário de uma fábrica de calçado em Sargodha, província de Punjab. Passavam poucos minutos das 7h da manhã quando uma multidão invadiu a sua fábrica e a sua casa, saqueando e incendiando o edifício. Embora dez membros da família tenham conseguido escapar, Nazir foi espancado e ficou gravemente ferido antes de a polícia chegar e conseguir afastá-lo da multidão. Foi levado para o hospital, e aí permanece na unidade de cuidados intensivos, em estado crítico, de acordo com relatos enviados à Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS).
“Sentimos que nenhum cristão está seguro”
“Este terrível incidente de violência popular deixou-nos [aos cristãos] muito aterrorizados, pois sentimos que nenhum cristão está seguro no Paquistão”, disse o padre dominicano James Channan, que dirige um centro de promoção da paz em Lahore, a segunda maior cidade do país, em declarações ao jornal Crux.
A blasfémia é um crime capital no Paquistão e pode ser punido com a morte ou com prisão perpétua. “No entanto, é frequentemente utilizada de forma abusiva para fazer falsas acusações e as multidões tomam o assunto nas suas próprias mãos e lincham os suspeitos”, alerta a Fundação AIS.
“Qualquer fanático e membro de organizações religiosamente fundamentalistas ou grupos terroristas pode simplesmente acusar qualquer cristão de blasfémia contra o Profeta do Islão ou de profanação das páginas ou queima do Alcorão Sagrado, e isso levará à violência da multidão e ao incêndio de casas, igrejas, espancando cristãos e até linchando-os”, explica James Channan.
O presbítero considera que um dos problemas reside no facto de os culpados por ataques deste género não enfrentarem, habitualmente, consequências legais pelas suas ações. “A grave injustiça que é cometida em relação aos cristãos depois de ataques tão horríveis é que ninguém é punido”, disse ele. “Se a justiça tivesse sido feita nos últimos oito a dez incidentes de violência popular, então tais incidentes poderiam não ter acontecido.”
O padre deixa um apelo ao governo do Paquistão para que reveja “as controversas leis sobre a blasfémia no Paquistão, que são frequentemente utilizadas para acertar contas pessoais”. E também às organizações internacionais, para pressionarem o governo a fazer mais para proteger os cristãos, que representam pouco menos de dois por cento da população do país, com 236 milhões de habitantes.
Desenvolvimento económico dos cristãos gera “ciúme”
“Condeno veementemente este incidente. É um dia sombrio para a Igreja no Paquistão”, disse por seu lado o bispo Samson Shukardin, de Hyderabad, presidente da Conferência dos Bispos Católicos do Paquistão, também em declarações ao Crux.
“Sem saber ou investigar [a acusação relativa ao Alcorão], a multidão atacou um homem cristão de 74 anos”, disse Shukardin, acrescentando que “os cristãos estão muito desapontados e com medo”. O bispo salvaguardou, no entanto, que embora muitos observadores se queixem há muito tempo de que tais episódios violentos são encorajados pelas controversas leis anti-blasfémia do Paquistão, a Igreja Católica não está a apelar à revogação dessas leis, mas sim ao bom senso na forma como estas são aplicadas.
“Muitos muçulmanos condenaram este incidente, há muitos bons muçulmanos, mas a maioria ataca com base em meras alegações”, lamentou, assegurando que “muitas das reclamações são baseadas em evidências inventadas, e as verdadeiras causas são vinganças ou ganhos pessoais”
Para o líder católico, não restam dúvidas: “o ciúme em relação ao desenvolvimento económico dos cristãos é uma das razões deste ataque”, sendo que os muçulmanos “usam a lei contra os cristãos para rivalidade profissional” e isso faz com que muitos cristãos tenham “medo de iniciar e abrir negócios, pois os muçulmanos não aceitarão isso”.
Shukardin confirmou ao Crux que dois outros incidentes “alarmantes” relativos a supostas blasfémias ocorreram noutras regiões do Paquistão desde este ataque, um dos quais envolveu o lançamento de pedras numa igreja.
Sem comentários:
Enviar um comentário