Diz-se que um homem é de palavra se cumpre as promessas que faz; e usa-se a expressão “homem de uma peça só” para quem se comporta de acordo com aquilo diz; as suas ações são coerentes com o pensamento que expressa. Estes comportamentos inspiram respeito e admiração, mais ainda porque costumam vir acompanhados de uma outra qualidade: a de se aplicarem a pessoas virtuosas. Alguém reconhece um mafioso como homem de uma peça só? Os filmes e livros sobre homens corruptos costumam retratá-los como gente temível; atraente e insinuante num primeiro contacto para logo se impor pelo medo, a chantagem, a ameaça.
Um homem de palavra pode enviar um embaixador, um filho ou um empregado de confiança como portador do documento ou objecto prometido. Serão sempre pessoas em quem confia e aos quais pode transmitir alguns poderes de acordo com a importância da missão e da pessoa que a executa. Porém, até o homem mais digno é falível. Por várias razões, doença, morte, etc. nem sempre consegue cumprir com a sua palavra. É isto que nunca acontece com Deus. O Antigo Testamento narra, com muitos pormenores, a falta de equilíbrio na Aliança feita entre Deus e os homens. Jahvé cumpre sempre com o prometido, mas o povo escolhido, não.
A grande promessa feita por Deus à humanidade foi a de que iria enviar um Salvador. Essa promessa cumpriu-se com a vinda do Messias. Jesus foi de facto o Verbo de Deus, a palavra de Deus. Não havia discrepância alguma entre o que dizia e o que fazia. Tinha poder de salvar os homens das consequências dos pecados, pessoais e original? Quando disse a um paralítico: “Os teus pecados ficam perdoados”, quem nos garante que sim, ficaram perdoados? Esta dúvida também passou pela mente de muitos que estavam presentes, mas Cristo descobriu-lhes os pensamentos e agiu de modo a manifestar o seu poder: “Que é mais fácil?”, perguntou, “Dizer a este homem são-te perdoados os pecados ou dizer-lhe levanta-te e anda? Pois, para que saibais que o Filho do homem tem poder sobre a terra de perdoar pecados, levanta-te” disse então ao paralítico “toma o teu leito e vai para tua casa” E ele levantou-se e foi para sua casa (Mt. 9, 5-8).
O episódio é extraordinário e completo, porque o paralítico foi levado por familiares ou amigos seus e podia ter ficado curado, mas recusar-se a levantar. S. Mateus diz que Jesus “viu a fé” dos que o levaram, mas não menciona a do enfermo. Parece que este saiu curado e com fé, ou não se teria erguido. Ao aceitar caminhar, ganhou integridade, tornou-se mais homem; e não tanto por poder caminhar, mas por saber obedecer. A obediência é um dom dos seres racionais que estão capacitados para entender o bem que corresponde a cada acto de obediência. Neste caso, foi o de andar. Ao ouvir e entender a ordem: “Levanta-te e anda”, o doente uniu-se à palavra, uniu-se ao querer divino e tornou-se mais humano, mais de acordo com a vocação que Deus lhe destinara. Também ele se tornou um homem de palavra: ao obedecer, o seu corpo agiu segundo os seus desejos; e os seus desejos deram força às capacidades do seu corpo que, até ali, estavam como que adormecidas. Assim, é natural que um homem de palavra aceite e dê ao seu corpo a possibilidade de ser e ser usado como é, sem o modificar para satisfazer modas ou caprichos. E menos ainda para o matar.
Isabel Vasco Costa
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