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sábado, 8 de junho de 2013

De família judaica de esquerda radical, ele era ateu e niilista... Até que leu a Bíblia

Fabrice Hadjadj, filósofo de primeira linha

Era comunista e de origem judaica. Só queria atacar a Igreja. Agora Fabrice Hadjadj é um dos maiores intelectuais católicos.

Actualizado 15 de Maio de 2013

Javier Lozano / ReL


Fabrice Hadjadj é um dos intelectuais católicos mais importantes neste momento. As obras deste pensador e professor francês estão-se convertendo numa referência no pensamento cristão e até Juan Manuel de Prada disse do seu livro A fé dos demónios que é “o melhor livro de teologia divulgativa que se escreveu em décadas”.

É um convertido mas falou-se muito pouco deste processo, talvez porque ele mantém que a conversão só é o ponto de saída, não o de chegada. Sem dúvida, este caminho até Deus diz muito de como é e mostra uma vez mais o poder salvífico que há na Escritura, um voltar à vida num pestanejar de olhos.

“A Palavra dava-me urticária”
“A minha família era judia e de extrema-esquerda e eu cresci no espírito da revolta”, conta o mesmo Hadjadj. Desenvolveu nele um ateísmo marcado pelo anarquismo. Além disso, a leitura de Nietzsche levava-o ao niilismo aumentando nele uma “violência anticristã” pois a palavra de Deus “dava-me urticária”.

Apesar das certezas que este jovem francês acreditava ter, Deus sempre surpreende e tinha-lhe preparado uma grande surpresa. “Um dia um amigo meu publicou um livro de aforismos, no qual cada um deles vinha precedido por uma citação bíblica”, recorda Fabrice, que graça a isto viu a oportunidade de ridicularizar Deus.

“Queria ler a Bíblia para fazer-me rir”, afirma. “Havia encontrado um procedimento mordaz para ridicularizar as Escrituras. O problema é que para escarnecer bem da Bíblia, há que lê-la”.

A leitura de Isaías e Job
Com a sua intenção de escarnecer da Igreja e de Deus, continua, “comecei com a leitura de Isaías e de Job. O choque! Que sopro mais incrível! Mais tarde reli os Evangelhos. Quanta simplicidade unida a tanta profundidade! A palavra de Jesus não era uma palavra como qualquer outra: era a palavra em carne, em osso e em espírito”. “Tinha querido desviar a Escritura, e era ela a que me devolveu ao caminho”, acrescentou.

A enfermidade do seu pai e o julgamento a um pró-nazi
Esse foi o primeiro encontro que teve com Deus e que o fascinou. Algo que já tinha no seu coração ainda que esquecesse o ocorrido. Sem dúvida, “uns meses mais tarde o meu pai adoeceu. Não sabia o que fazer para ajudá-lo. Corri à igreja de Saint-Séverin, próxima da minha casa em Paris. Esta era a igreja na qual tinha escarnecido dos paroquianos uns dias antes. Então orei e foi uma revelação. Não era uma grande luz, era uma voz descendendo do Céu. Estava em paz e a paz mostrou-me que a oração é a essência da palavra, o lugar próprio do homem”.

Conta o mesmo Hadjadj que “outro sinal de Deus na minha vida foi o julgamento a Paul Touvier”, um colaboracionista nazi condenado por crimes contra a humanidade por ordenar fuzilar sete judeus em 1944. “Assisti porque um amigo meu era advogado no julgamento. Vi esse tipo no banco dos acusados, um tipo como tu e eu que não podia ver o diabo”.

Essa tarde na sua casa este jovem perguntava-se se “haveria sido melhor que este homem”. “De repente descobri a minha miséria interior” e pensou em Cristo, “como um Inocente, um absoluto Inocente veio para redimir-me com toda a humanidade manchada pelo mal, para salvar-me com todos, vítimas e verdugos”.

Cinco anos mais tarde “fui baptizado na Abadia de Solesmes”. Soube anos mais tarde que foi precisamente o lugar no qual o condenado no julgamento a que assisti e que lhe abriu os olhos se tinha escondido durante meses.

Professor, pai de família e defensor da vida

A sua vida mudou por completo depois de descobrir a fé. Não queria ter filhos e agora tem seis. Desde a sua coluna no Le Figaro e desde outros medias foi um dos intelectuais que com mais veemência argumentou contra o matrimónio e adopção por parte de homossexuais aprovada em França recentemente. Actualmente é além de um importante escritor, professor de Filosofia em institutos, universidades e no Seminário de Toulon.

Apesar da história de conversão que fez Deus com ele, Fabrice não gosta de falar demasiado dela. “Não gosto de ser anedótico e retrospectivo. A conversão é um ponto de partida, não de chegada. É como um nascimento. Mas não se pode perguntar aos convertidos unicamente por aquilo que sucedeu no momento do parto. Perguntam-me com frequência sobre o meu baptismo, que foi algo extraordinário. Mas perguntam-me menos pelo meu matrimónio que, sem dúvida, é o complemento do meu baptismo. Poderia escrever milhares de páginas sobre a minha conversão. Mas se dissesse aquilo que que me fez cristão seria prisioneiro de algo que pertence ao passado. Devo sempre poder dizer que se sou cristão é também graças a ela, que está ao meu lado. O que fundamenta a fé é sobretudo o assombro ante aquilo que me rodeia”.

O demónio, muito presente no mundo de hoje
Um dos seus livros mais importantes trata precisamente sobre o demónio, o príncipe deste mundo. Assim, adverte de que “há que entender que o ateísmo e o liberalismo não são as piores dores de cabeça, já que o diabo não é ateu. Então, para evitar as armadilhas de um demónio, que sabendo exactamente a verdade, sabe levar-nos a erros dando-lhes um aspecto atractivo: utiliza a nossa energia para lutar contra um erro fazendo-nos cair no erro oposto”.

Do mesmo modo, disse que os cristãos devem ter cuidado com a “fé desencarnada, na qual um se dedica a ‘organizações benéficas imaginárias’ e nos esquecemos de amar o nosso próximo na nossa casa ou na nossa própria cama”.

A sua vida e a sua experiência acreditaram-no como um dos pensadores da Igreja mais acreditados para o diálogo fé-razão e com o mundo não crente. “Hoje em dia está na moda dizer ‘sou ateu’, ‘sou homossexual’, etc…Ninguém diz ‘sou um homem’. O importante para o crente é compreender que ante ele tem sempre um homem. Um que está como eu exposto ao pecado e à morte e talvez um pouco menos consciente do Mistério”.


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