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quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Tempo de mudar

No centro de Boston há um memorial em bronze alusivo aos irlandeses que chegaram na região, no século XIX, acuados pela fome. Uma placa aos pés da peça que mostra um casal e seu filho, famintos, lembra que alguns fatores que provocaram a grande fome ainda existem no mundo e  que a lição irlandesa deve ser aprendida para que a história pare de se repetir. Outro conjunto mostra uma família ereta, a exalar dignidade. A placa que a ela corresponde informa que apesar da rejeição dos bostonianos da época, aqueles irlandeses miseráveis, com sacrifícios e trabalho, venceram. E um de seus descendentes tornou-se o primeiro presidente católico do país.

Kennedy graduou-se em Harvard e foi o mais jovem presidente norte-americano. Tivemos a felicidade de visitar o museu John Kennedy, na baía de Boston, e de assistir inúmeros discursos em que se percebe a forma simples e firme de expor suas ideias. Frasista de primeira grandeza, num dos debates televisivos da campanha em que bateria Nixon por pouco mais de cem mil votos, num colégio eleitoral de sessenta milhões, Kennedy lembra uma frase de Lincoln em que este questiona como poderia um país viver com uma metade escrava e a outra metade livre. Afirmou, então, que a pergunta mudara: como poderia o mundo viver com uma metade livre e a outra metade escravizada? Tomava por escravos os miseráveis e os que viviam sob a bota comunista. Hoje, como sabemos, os candidatos a escravos são os que não detêm tecnologia.

Com filmes da época, o museu revive momentos importantes e perigosos daquele período,  como a crise dos mísseis em Cuba, a corrida espacial e o racismo. A segregação racial nos Estados Unidos era tamanha que George Wallace, governador do Alabama, estado no qual dois estudantes negros haviam sido impedidos de frequentar a universidade, manifestou-se por forma inacreditável. Disse que a segregação existia e continuaria a existir, para sempre. Foi necessária a intervenção federal para garantir o que deveria ser respeitado como um direito natural.

Estivemos também no Massachusetts Institute of Technology (MIT). Casualmente era dia de formaturas e pudemos observar a alegria de graduados e doutorados naquela que é referência mundial em ciência e tecnologia. Numa das fotos que bati, capturei um pai a fotografar o filho, togado, diante de uma placa com o nome da instituição. Era possível apalpar o orgulho daquele pai. Foi decididamente uma cena bonita, como o é sempre a conquista pelo mérito. Um momento que guardei no peito, primeiro como pai e depois como brasileiro. Foi inevitável lembrar que no Brasil a lei do menor esforço tem preponderado e que muitas políticas públicas têm enfraquecido o povo, tornando-o dependente e pouco competitivo.

Convivi profissional e academicamente com brasileiros doutorados pelo MIT, todos merecedores da minha admiração. Um deles, graduado também pelo ITA, migrou para o Canadá. Os demais mantiveram-se ligados à Universidade de São Paulo e fazem, ou fizeram, bem menos do que poderiam, sobretudo porque o país não aproveita da melhor forma seus filhos mais competentes.

Por conhecer esta realidade bem de perto, a lamento com pesar tão profundo quanto quase desesperançado. Luto contra esta derrota de alma, aquela que nos faz perder a fé no país, mas é forçoso reconhecer que os últimos anos têm sido verdadeiros murros no queixo de nosso futuro, que dobrou os joelhos e está nas cordas. Para os que se contentam em produzir commodities, para os que não se importam que nossa produção tecnológica e científica seja medíocre, tudo corre muito bem. Para os que se contentam em viver num país estacionado, para os que têm como objetivo maior apenas sentar num automóvel moderno ou de vez em quando desfrutar dos prazeres que o mundo desenvolvido oferece, tudo vai bem e nada precisa mudar.

Mas os que sonharam com um Brasil competente e não se renderam, estes devem persistir na luta e empreender no país. Ainda que sejamos governados por alguns desonestos e sobretudo por boçais e incompetentes, nos resta esperar que os brasileiros que cada vez mais viajam para o exterior deixem de se comportar como deslumbrados e enfim decidam fazer do Brasil um país melhor. Se seguirmos o que Benjamin Franklin apregoou para a educação, daremos o grande passo: “Me fale e eu esqueço, me ensine e eu posso lembrar, me envolva e eu aprendo”.
  
J. B. Teixeira



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