No dia 1 de
novembro, festeja-se no mundo católico, a Solenidade de todos os Santos, isto
é, de todos aqueles que, não tendo sido festejados em dias assinalados, são
assim comemorados em conjunto. São lembrados como santos, porque se considera
que gozam da presença de Deus. Em Portugal é feriado, um feriado religioso. A 2
de novembro, celebram-se os Fiéis Defuntos, aqueles que não acederam ainda à
presença de Deus, precisando de serem purificados. Acorrem ao cemitério aqueles
que querem honrar a sua memória, orando pelas suas almas, ou apenas
lembrando-os apenas, mas todos depondo flores nas suas campas. Como o dia 2 é
um dia normal de trabalho, não sendo feriado, comemora-se o dia na véspera,
juntando as duas solenidades.
O culto dos
mortos é tão antigo como a humanidade. Antropólogos e historiadores consideram
que, pelo menos desde o século VI antes de Cristo, os celtas, povos que
habitavam o noroeste da Europa, em territórios correspondentes, na
atualidade, à Irlanda, Inglaterra, França, Alemanha e países nórdicos,
celebravam o fim do ano no final de outubro, quando acabavam as colheitas. Para
eles, o ano dividia-se em duas partes, verão e inverno. Realizavam então a
festa do sol, a que chamavam, em irlandês, o Samhain, a festa da passagem do
ano. Julgavam esses povos que os deuses permitiam que os mortos regressassem à
Terra. Isso constituía uma preocupação para os vivos, porque achavam que os
mortos os perseguiam com a intenção de lhes fazer mal e de se vingaram de quem
os tivesse prejudicado quando eram vivos. Assim, disfarçavam-se para não serem
reconhecidos, oferecendo sacrifícios, por vezes humanos, para os
acalmaram. Com a cristianização da Europa, muitas festas pagãs foram
transformadas em festas cristãs e, assim, foram aproveitadas essas datas, mas
com outro significado.
Foi o que
aconteceu com a Festa de todos os Santos e com a comemoração dos Fiéis
Defuntos: resultaram da cristianização do Samhain. No entanto, as tradições
pagãs continuavam de forma mais ou menos disfarçada.
E donde
aparece Halloween? É uma deturpação de All hallow’s eve que
significa, em inglês antigo, véspera de todos os Santos, designação que o
Samhain adotou foi cristianizado.
A famosa
abóbora com uma lanterna dentro também nasceu na Irlanda. Tinha um sentido
moralizante. Conta a lenda que um tal Jack era um indivíduo que se julgava
muito esperto. Enganava toda a gente, não cumpria as promessas feitas e até
enganou o diabo por três vezes. Quando morreu, São Pedro não o recebeu no Céu,
e o diabo também não o quis e, além de não o querer, condenou-o a voltar para o
mundo e a andar acompanhado por uma abóbora oca com uma chama no interior por
única iluminação.
Assim a
abóbora é um símbolo de penitência. Eu lembro-me ainda, na minha infância, de
os rapazes andarem com abóboras iluminadas e isso metia-nos medo, não sei
porquê.
A tradição de «doçura ou travessura» também tinha uma origem simpática entre
os antigos celtas. Como o ano acabava, os meninos iam a casa dos vizinhos
pedirem perdão pelas travessuras que tinham feito durante o ano. Os vizinhos
perdoavam e, em sinal de paz, davam-lhes guloseimas. O Halloween foi levado
para os Estados Unidos pelos irlandeses, lá se implantou e de lá regressou à
Europa como se fosse uma tradição americana. Primeiro foram os meninos alunos
de inglês, que incentivados pelos seu professores, iam de casa em casa, com a
cara enfarruscada, pedir <<doçura ou travessura>>. Depressa o
consumismo viu o filão que isso era. A pouco e pouco as farruscas feitas na
cara com carvão foram substituídas por máscaras alusivas a bruxaria a
venderem-se em todas as lojas, depois os bares e as discotecas começaram a
organizar as suas noites loucas de divertimento com decoração apropriada. Será
globalização? Aculturação? Não sei. Que continue, não se pode voltar atrás. Mas
que não se perca a tradição portuguesa do <<Pão por Deus>>, em que
os meninos iam com uma saca feita com restos de tecidos, em pequenos grupos,
perguntando : Oh! Tia, dá pão por Deus? Se não tem, dê-lho Deus. E as
pessoas davam do que tinham, frutos secos, ou mesmo pão.
Esta tradição remonta ao ano a
seguir ao terramoto. A maior parte da população de Lisboa, se já era pobre
antes dessa tragédia, mais pobre ficaram os que sobreviveram. Então, no
primeiro aniversário do cataclismo, saíram à rua pedindo pão por Deus,
aproveitando ser uma festa religiosa. E a tradição ficou, até à década de 80,
quando começou a ser substituída pelo Halloween. Quando será retomada? Se foram
os professores de inglês que iniciaram a tradição dita americana, que sejam
agora os professores de português e de história a retomar a tradição portuguesa.
Cecília Rezende |
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