Já muito se falou sobre o assunto
em epígrafe. Acredito que a sociedade se sente envolvida neste debate sobre a
vida porque é disso que se trata. Ainda assim, atrevo-me a abordá-lo novamente,
numa perspetiva muito sentida de quem já passou por vários momentos, em que a
vida dos nossos entes queridos dependia da nossa influência e capacidade de
decisão, em momentos de grande sofrimento em que parecia que tudo aquilo em que
acreditamos, está quase posto em causa, perante um grande e quase infindável sofrimento.
Queremos certamente o melhor para o nosso ente querido, que pode ou não ter
vontade de partir rumo à vida eterna. Algumas pessoas agarram-se à vida, com
uma força enorme, querendo tudo ultrapassar e vencer. Outras nem por isso.
Sabem que o momento final se aproxima e querem partir em paz, quando chegar o
seu momento rodeadas pelo amor da família, que se tona imprescindível nestes
momentos mais dolorosos, e igualmente com todo o apoio dos cuidados
assistenciais que ajudam a que estes momentos sejam menos dolorosos.
Este debate tão importante traz a
lume, a grande falta de respostas para estas situações, refiro-me em
particular, aos cuidados paliativos. Mas não só. Há na realidade muito a fazer
neste campo, face ao envelhecimento da população. Refiro-me aos idosos que se
encontram sós, às vezes nas cidades, as quais não se encontram preparadas
tantas vezes para pessoas com dificuldade de locomoção, cadeiras de rodas,
idosos que vivem em prédios antigos, sem elevador, ou seja, sem possibilidade
de saírem de casa. Tenho observado que, quando os idosos frequentam atividades
físicas, culturais, realizam trabalhos manuais, mantendo as suas capacidades
cognitivas, são muito mais felizes e têm menos problemas de saúde. Uma forma de
ajudar a minimizar a solidão, são as relações intergeracionais. Há algum tempo,
soube de uma universidade que organizava visitas a pessoas dependentes com as
quais organizavam alguma atividade cultural. Sobretudo, importa ajudar a ultrapassar
a combater a enorme solidão em que se encontram. Claro que as autarquias e as juntas
de freguesia pela sua proximidade têm um importante papel a desempenhar, bem
como as instituições de solidariedade social. As escolas também têm um papel de
extrema importância. Recordo que uma pessoa amiga que se encontra num lar,
referia a enorme alegria quando as crianças de uma escola vinham passar uns
momentos com os residentes na aula de educação física, ajudando-os a concretizar
as atividades, chamando-os por avós, e trazendo pequenas lembranças normalmente
desenhos feitos por elas relativos às épocas festivas. Os passeios, mesmo que
pequenos, para um lanche, para ver as iluminações de Natal, para ver o mar numa
praia, retirando-os do seu ambiente diário, constituem uma alegria enorme.
Recordo também a este propósito
que há uns anos atrás levei uma idosa com cerca de 90 anos à praia. Referia que
tinha saudades do mar. O passeio foi à Praia das Maçãs. Foi uma alegria enorme.
Quis saber qual a razão por que tinha esse nome. Referi que o riacho que vinha
desaguar no mar antigamente passava pelos campos cobertos de maçãs caídas no
chão e que as trazia para o mar. Sentada numa cadeira à beira-mar, emprestada
pelo banheiro, debaixo do chapéu de sol, observava tudo em redor mostrando uma
alegria contagiante. Uma criança trouxe-lhe um balde de água com um pequeno
caranguejo. Que felicidade! A certa altura, decidimos que o melhor, seria
levá-la até à beira-mar, já que o mar se encontrava muito calmo nesse dia, no
sentido de molhar os pés. Quanta alegria, que risada enorme! Ainda hoje se recorda
desse dia. Mas o passeio não acabou aqui. Depois da praia, levámo-la a almoçar
em Sintra, num restaurante que frequentava anteriormente na companhia do marido.
Na realidade, recordei que “há mais alegria em dar do que em receber”. Não sei
quem estava mais feliz.
Imbuídos deste espírito de cidadania,
de entreajuda, de disponibilidade para criar novos projetos que vão de encontro
às reais necessidades sentidas para quem precisa de companhia, de afeto, de
apoio médico, de assistência especializada de saúde, de assistência social, de
habitação, de justiça, procuraremos, assim, contribuir para que a vida se
prolongue até ao momento em que surja o Ocaso Natural em vez de se aprovarem leis
como a da Eutanásia.
Termino este artigo recordando
algumas frases que o Papa Francisco referiu sobre este tema, dando ênfase à
falta de compaixão, pretendendo resolver os problemas eliminando a vida humana.
Pelo contrário deve-se cuidar da pessoa, sobretudo quando sofre, é frágil,
indefesa. Cada ancião, embora enfermo ou no fim dos seus dias, leva em si o
rosto de Cristo. O grau de progresso de uma civilização mede-se justamente pela
capacidade de proteger a vida, sobretudo nas fases mais frágeis. Amar a vida é
sempre ocupar-se do outro, desejar o seu bem, guardar e respeitar a sua
dignidade transcendente.
Maria Helena Paes |
Sem comentários:
Enviar um comentário