A vida tem destas coisas. Há quanto tempo aguardava pela disponibilidade da minha irmã para fazermos um passeio a pé pela baixa pombalina, sobretudo, pela Praça do Comércio, após as obras de recuperação, como se fossemos mais duas turistas. A oportunidade surgiu afinal quando uma amiga, que reside no estrangeiro há alguns anos, manifestou esse desejo, quando nos encontrámos para tomar um café e colocar as novidades em dia. Face a este contexto resolvemos deslocarmo-nos de metro fugindo assim das preocupações com o tempo, o estacionamento, podendo usufruir em pleno do dia. Saímos na zona dos Restauradores, passámos pelo Rossio, em direção à Rua Augusta, sempre maravilhadas com a beleza paisagística da cidade num dia com o céu azul, cheio de sol, com uma luminosidade que só a cidade de Lisboa tem para oferecer. A Rua Augusta repleta de esplanadas cheias de turistas, com o arco ao fundo, podendo-se ainda visualizar a estátua do rei D. José I, era de uma beleza ímpar. Sentia-me feliz por finalmente fazer este passeio a pé na companhia da minha amiga que saudosa de Portugal, não se cansava de observar todos os pormenores. Chamou-me a atenção para um café com pastéis de bacalhau recheados de queijo da serra. A não perder segundo ela. A hora é que não era de todo conveniente.
Enquanto caminhava a seu lado pensei numa frase de Calvin Coolidge. “Todo o crescimento depende da atividade. Não existe desenvolvimento fisicamente e intelectualmente sem esforço, e esforço, significa trabalho”. Ou seja, sem trabalho nada se faz e as dificuldades ajudam-nos a crescer. Também Peter McWilliams referiu: “As zonas de conforto são frequentemente ultrapassadas, através do desconforto”. Obrigam-nos a mudar, a esforçarmo-nos e a adaptarmo-nos. O sucesso está continuamente a melhorar-nos enquanto pessoas, o modo como vivemos, como servimos e como nos relacionamos. Tanto tempo a aguardar a disponibilidade de alguém, quando o poderia ter feito só. Mas Deus escreve direito por linhas tortas, e aqui estava eu, desta vez com uma amiga a colmatar uma necessidade sentida.
Chegámos entretanto à Praça do Comércio. Sustive a respiração tal era a sua beleza. As esplanadas estavam repletas de turistas, com um ar descontraído, de plena satisfação, de quem se encontra a usufruir do sol, de um momento relaxante, com uma paisagem sublime. As gaivotas esvoaçavam. Os cacilheiros faziam a travessia. A Ponte 25 de Abril em todo o seu esplendor, o tom azul das águas do rio, os aviões que de vez em quando sobrevoavam rumo ao aeroporto. O Cristo-Rei, do outro lado do rio, que parecia querer, de braços abertos, acolher a todos. Recordei que neste local existia outrora o Palácio dos Reis de Portugal, o Paço da Ribeira que durante cerca de 250 anos foi a residência dos reis, fazendo parte do dia-a-dia dos lisboetas.
O Palácio Real seria totalmente destruído em 1755 aquando do terramoto que assolou a cidade seguido de maremoto. Infelizmente para além de todas as vítimas mortais e destruição do património, perderam-se os incalculáveis tesouros de arte de recheio do Palácio acumulados ao longo de 250 anos, período áureo que corresponde ao apogeu do poder e da riqueza portuguesa no mundo. Este lugar daria então origem ao Complexo Ministerial do Terreiro do Paço, com esta belíssima praça que constitui uma das mais belas e das maiores praças da Europa com cerca de 36.000 m2, de uma beleza ímpar, que se debruça sobre o Rio Tejo. A estátua equestre do rei D. José I, ao centro, pretende perpetuar a memória deste rei, enquanto reedificador da cidade de Lisboa, constitui uma notável obra em bronze, de 14 metros de altura, enquadrada pelo belíssimo Arco da Rua Augusta, fazendo assim sobressair a representação do poder régio.
Virada para o Rio Tejo, no Cais das Colunas, pensava na riqueza da nossa história. Que majestoso património possuímos! E o rio que, de tão largo, evoca o mar? Quantas histórias ficaram por contar devido aos naufrágios. A evocação da época dos descobrimentos, constitui um mundo fantástico de descoberta, de aventura, do conhecimento de outros povos, culturas, realidades, saberes e riquezas… ”Glorioso é o lugar conquistado por Portugal entre as Nações… Lisboa amiga, porto e abrigo de tantas esperanças” (Papa Bento XVI, homilia no Terreiro do Paço em Maio de 2010). Cito ainda Fernando Pessoa tão ligado a este local: “Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal”.
A minha amiga ficou encantada com a recuperação desta zona. Fizemos o percurso a pé até ao Chiado, onde finalmente, saborearíamos o famoso pastel de bacalhau e um pastel de nata como não podia deixar de ser, enquanto lisboetas, para celebrar a vida e o encontro.
Maria Helena Paes |
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