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domingo, 2 de julho de 2017

Tempo de Garantia

Ao comprar um electrodoméstico, é prudente saber qual o seu prazo de garantia. Cada máquina tem um prazo previsto de duração; os homens e as suas acções, não. O tempo de vida do homem varia de zero a pouco mais de cem anos; as consequências das suas acções têm um começo, mas podem não ter fim. Isso levou-me a pensar no modo como evolui a relação de cada pessoa com o mundo e na evolução do seu sentido de responsabilidade. O bebé depressa aprende que as quedas causam dor, mas necessita mais tempo para entender que também fazem sofrer os adultos. Deve saber, com a ajuda dos seus educadores, que os seus actos têm consequências e que é responsável por eles. Se a criança se magoou, não deve culpar a cadeira “má”, mas perceber que foi imprudente.

Os nossos actos têm valores e tempos de duração diferentes que variam desde o péssimo ao excelente e desde o efémero ao eterno. Também podem ser classificados como sendo actos para utilidade própria, ou egoístas; actos de serviço aos outros, ou altruístas; actos de generosidade, etc. À medida que crescemos e que, acompanhando a idade, vamos amadurecendo e trabalhando, o “tempo de duração” das nossas acções vai aumentando. Por exemplo, o estudo faz aumentar o valor e duração das nossas capacidades que se desenvolvem com a persistência, facilitando a aquisição de novas valias, embora todas elas limitadas e finitas. 

Quais são então os actos que podemos praticar com um tempo de garantia infinito? Um telefonema inopinado serviu-nos para compreender que esses são actos acessíveis a qualquer pessoa, actos de fácil execução, mas de valor transcendente. A minha interlocutora tentava satisfazer o pedido de uma amiga cujo pai estava em vésperas de segunda operação delicada. Sofria e já tinha dificuldade em caminhar. Desejava ardentemente confessar-se antes da cirurgia e toda a família estava empenhada em satisfazê-lo. Foi imensa a alegria de todos quando o confessor os consolou com a sua presença amiga. 

Há pessoas cujos actos, próprios das responsabilidades inerentes à sua vocação, têm um tempo de garantia infinito, eterno. É o caso dos sacerdotes e dos pais. Sim, os pais geram filhos que vão gerar novos filhos... e assim até ao fim do mundo. É um acto de amor que durará por muito tempo, mas um tempo finito. Porém, se decidem baptizar filhos, estão a torná-los filhos de Deus para sempre. É garantido! Esse cuidado é um acto de amor com um tempo de garantia válido para a eternidade. Não necessita de seguro. É certo que este sacramento deve ser administrado por um presbítero, mas o mérito desse acto passa pela vontade dos pais que, além disso, costumam ensinar as crianças a rezar, ensinam-lhes o catecismo, levam-nas à Missa ao Domingo, etc. Tudo actos muito simples, mas de enorme importância e transcendência, pois a boa formação dos filhos irá reflectir-se entre os amigos, colegas de trabalho, familiares, netos..., por muitas gerações. Toda a sociedade, todo o mundo, todas as gerações seguintes ganharão algo com estes acontecimentos de tanta importância, embora discretos, muito discretos mesmo.

São actos discretos e simples. Tão simples que pode bastar um telefonema para se contribuir para alcançar algo de bom e com um tempo de garantia infinito, como aconteceu no caso atrás referido.

Isabel Vasco Costa



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