A chamada lei “anti-mesquitas” apresenta elementos de “perplexidade e
preocupação não só para os católicos, mas também para as outras
comunidades religiosas”
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Os meios de comunicação italianos já a chamam de “lei
anti-mesquitas”, embora a proposta em debate na região do Veneto, ao
norte do país, fale de uma “alteração na lei regional sobre governo
territorial que visa introduzir uma nova normativa para regulamentar a
construção de edifícios e instalações de interesse público para serviços
religiosos, a fim de proporcionar aos municípios critérios homogéneos
para garantir uma adequada qualidade urbana às áreas designadas para
este objectivo”.
As alterações legais propostas já provocam polémica na Itália.
Nesse contexto, o patriarca de Veneza, Francesco Moraglia, declarou:
“Espero ler o texto final, que vai ser apresentado dentro de poucos
dias, mas já pedi alguns pareceres para além das polémicas estéreis e da
oposição fácil. Encontrei os representantes das confissões cristãs de
Veneza, com quem compartilhamos uma ampla reflexão sobre a proposta de
lei.
Constato com pesar que as alterações propostas ainda contêm elementos
de perplexidade e preocupação para o exercício do direito
constitucional à liberdade religiosa. Esta observação, é claro, vale não
só para os católicos, mas também para as outras comunidades religiosas.
Para ser claro, parece que a construção de todo novo edifício ou
‘estrutura’ para o culto ou ‘serviços religiosos’ – em nosso caso,
igrejas, paróquias – é equiparada à construção de um novo centro de
serviços.
Uma igreja ou as salas de catecismo, com todo o respeito aos outros
tipos de actividade, não podem responder à mesma lógica que gere a
criação de um centro comercial, um posto de gasolina, um ginásio de desportos; estas realidades empresariais talvez possam ser colocadas em
áreas predefinidas “para serviços”, fora dos centros históricos e longe
das residências, com compromissos e custos de urbanização suportados pelos
empreendedores, uma vez que são actividades económicas com fins
lucrativos. Mas não pode ser dito o mesmo das realidades de culto.
O risco é o de contradizer a grande tradição que marcou profundamente
o catolicismo do povo do Veneto, uma realidade ainda viva na nossa
história, no nosso território e para muitos dos seus habitantes.
A paróquia, de fato, sempre surgiu onde as pessoas vivem, com as suas
necessidades e urgências quotidianas. O termo ‘paróquia’ indica
justamente a proximidade das casas e da vida das pessoas. Estamos
falando de estruturas que compõem as nossas comunidades – e a Igreja não
é uma agência de prestação de serviços!
Se os nossos pais e avós tivessem agido de acordo com a lei que agora
se propõe, não só não teríamos hoje os esplêndidos tesouros artísticos e arquitectónicos que tornam famosos em todo o mundo os nossos centros
históricos, mas, ainda mais grave, não poderíamos desfrutar da benéfica e
capilar presença de paróquias, centros de aconselhamento e obras de
caridade e solidariedade que representam uma autêntica riqueza para o
nosso tecido social, tanto nas cidades como nas áreas rurais.
O nosso Veneto é também composto por pontos de agregação como as
nossas paróquias, que estão presentes, repito, onde vivem as
comunidades, feitas de crianças, jovens, famílias, idosos e pessoas
frágeis.
É claro que todos nós entendemos que a situação actual é complexa e
fragmentada, e, portanto, requer muita atenção. Devem ser exigidas as
corretas medidas de segurança, uma forte responsabilidade e respeito por
parte de todos e um senso mais profundo da legalidade, mas não se pode
renunciar ao princípio civil e religioso que garante o direito
fundamental à liberdade religiosa.
A liberdade religiosa, respeitosa da consciência, das boas regras e da vida civil, deve ser, mais do que nunca, reforçada.
Não a restrinjamos! O exercício da fé, inclusive público, é um valor
civil e eclesial que permite a todos expressar-se respeitando as crenças
do outro.
‘O direito à liberdade religiosa – cito o Concílio Vaticano II, na
declaração Dignitatis Humanae, número 2 – não se baseia em uma
disposição subjectiva da pessoa, mas na sua própria natureza (…) e o seu
exercício, quando é respeitada a ordem pública, não pode ser de maneira
alguma impedido’.
Espero que ainda haja tempo e, sobretudo, sincera vontade de todos
para reflectir, com serenidade e espírito construtivo, sobre uma questão
que é tão delicada, antes de legislar sobre questões vitais para todos
os venetos e não apenas para as comunidades religiosas”.
in
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