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domingo, 28 de agosto de 2022

Von der Leyen falou da Europa e da sua condição de crente

Em visita a Taizé

 | 27 Ago 2022

Von der Leyen não foi apenas debitar mais um discurso. Refugiou-se em Taizé durante 48 horas, para conhecer a comunidade ecuménica, falar com os jovens e participar nas atividades que pautam o ritmo das pessoas. Imagem captada da transmissão do YouTube.

Von der Leyen não foi apenas debitar mais um discurso. Refugiou-se em Taizé durante 48 horas, para conhecer a comunidade ecuménica, falar com os jovens e participar nas atividades que pautam o ritmo das pessoas. Imagem captada da transmissão do YouTube.

A presidente da Comissão Europeia (CE), Ursula von der Leyen, surgiu este sábado em Taizé, no Sul de França, a falar das grandes opções das políticas da União, como havia sido anunciado, mas também a falar das motivações profundas de crente, que não são indiferentes à sua ação política.

A primeira surpresa, tanto para os que estavam esta semana naquela comunidade como para os que a seguiam pela Internet, foi que Von der Leyen não foi apenas debitar mais um discurso. Refugiou-se ali durante 48 horas, para conhecer a comunidade ecuménica, falar com os jovens e participar nas atividades que pautam o ritmo das pessoas. “A experiência ultrapassou as expectativas”, nas suas palavras.

Nunca tendo ido a Taizé, há muitos anos que ela se sentia perto do “espírito de Taizé”. Como explicou no início da sua intervenção, a pedido do irmão Aloïs, prior da comunidade, quando era jovem, há perto de meio século, os irmãos e primos vinham da Alemanha até àquela aldeia onde o irmão Roger Schütz decidira, décadas antes, criar um centro de acolhimento de refugiados. Foi uma época de “escuridão e de dúvidas” na família de Ursula von der Leyen, pois uma irmã com 11 anos tinha morrido de cancro. A verdade é que os familiares regressavam “diferentes”, como ela confessou.

Sabia-se que a presidente vem de uma família luterana e que é mãe de sete filhos. Mas neste sábado, no período de diálogo com os presentes, a primeira pergunta, vinda de um jovem de Hong Kong, não teve muito a ver com conteúdo da intervenção que acabara de escutar. Ele pretendia saber que papel tem Deus nas decisões políticas da presidente da CE.

Ela não se fez rogada na resposta. “Está sempre presente, porque a fé está sempre presente na pessoa que sou”, começou por dizer. Está presente também, no sentido de que tem a noção de que “um dia, terá de prestar contas pelo que fez e deixou de fazer”. Finalmente, porque, nos dias mais complicados e angustiantes, tem um mote que a acompanha — “Independentemente daquilo que venha, não posso cair mais fundo que não seja nas mãos de Deus” — e isso dá-lhe um sentimento de que Deus está com ela.

Três desafios: a paz, o planeta e a solidariedade intergeracional

A conferência propriamente dita, sobre a atualidade europeia, foi inspirada na parábola dos talentos, sobre a qual se havia refletido em Taizé, no sentido de tesouros que nos são confiados e aos quais podemos ser ou não fieis, dependendo dos objetivos que queremos dar à vida.

Nesta linha, Ursula von der Leyen disse que cada geração tem “uma missão” relacionada com os tesouros que lhe foram confiados. Assim, a geração dos fundadores da União Europeia, perante uma Europa dividida e dilacerada pela guerra, deu-se como tarefa pacificar a sociedade e unificar o continente. Essa missão permitiu passar à geração da atual presidente da CE o que chamou “um imenso tesouro” de uma Europa em paz e com prosperidade, uma União que é uma “democracia de democracias”, ainda assente em valores que não pode descuidar, porque são frágeis e carecem de aprofundamento.

E chegou à questão-chave: que continente quer e pode a geração atual deixar à geração seguinte, a daqueles que escutavam a oradora? Em resposta a dirigente europeia apontou três grandes desideratos: o compromisso com a paz; o compromisso com o planeta; e a solidariedade entre as gerações.

“A paz é hoje um bem partilhado entre os 27 países da União e é impensável que os seus membros entrem em guerra entre si”, observou. Mas a verdade, continuou ela, é que aquilo que parecia impensável aconteceu: a guerra desencadeou-se nas fronteiras da Europa, em virtude da invasão por parte da Rússia.

O valor da paz, que é fundador da União, saltou de novo para o centro da política europeia, com os objetivos de assegurar a paz e a segurança na Europa. E, sublinhou a oradora, foi porque os valores básicos que sustentam a União foram postos em causa, que esta se colocou ao lado da Ucrânia e tem estado a ajudá-la.

“Meus amigos, se a Rússia parar de lutar, deixa de haver guerra na Ucrânia; mas se a Ucrânia deixar de lutar, deixa de haver Ucrânia”, enfatizou Von der Leyen, num ponto sublinhado por forte aplauso da assistência.

Quanto ao segundo desiderato, relacionado com a Casa Comum, começou por afirmar que “a Criação foi-nos confiada, mas a Criação não nos pertence e nós esquecemos isso”. “O tesouro que herdámos e que devíamos preservar e cuidar devorámo-lo bocado a bocado, numa economia que extrai, consome e deita fora. Isto não pode continuar”, afirmou. Neste contexto, referiu a importância do “Pacto Ecológico Europeu” que, entre outros objetivos, pretende aproveitar a atual situação de crise (relacionada com a guerra) para acelerar a transição para as energias limpas, reconhecendo, embora, que tanto a pandemia como, já em 2022, a invasão da Ucrânia fizeram retardar os planos, para responder a situações de emergência.

As responsabilidades globais com o planeta dependem de aspetos geoestratégicos, mas são uma questão de sobrevivência e, nessa medida, são responsabilidade da atual geração para com as próximas gerações. E isto é algo que tem a ver com a solidariedade intergeracional, o terceiro ponto da conferencista.

A esperança de Ursula e a ‘radical incerteza’ dos jovens

Ursula von der Leyen disse-se consciente deste desafio, também em termos pessoais e familiares, e reconheceu que se está a colocar um fardo pesado nas gerações mais novas; desde logo, o fardo “da radical incerteza” em que estão cada vez mais a viver. Citou, a propósito, o Papa Francisco que, para caraterizar este momento, afirmou: “Sempre que um jovem cai, toda a humanidade cai. No entanto, quando um jovem se levanta novamente, o mundo inteiro também se levanta.”

Afirmou-se confiante no futuro, dando como exemplo o que, durante a fase mais complicada da pandemia, os mais novos deram no apoio aos mais velhos, desde logo aos avós, e citando também os gestos de milhares de jovens que se voluntariaram para apoiar os refugiados da guerra na Ucrânia. Citou, por outro lado, várias iniciativas da União Europeia para apoiar os jovens, nomeadamente nos campos da formação e emprego.

Num dos momentos de contacto com os jovens, Ursula von der Leyen esteve com um pequeno grupo de jovens portugueses, que com ela cantaram o hino da Jornada Mundial da Juventude de Lisboa, como se pode ver num vídeo publicado pelo DN.

(Esta notícia foi escrita com base na audição da conferência, procurando ser fiel aos pontos essenciais do que foi dito. Entretanto, o texto foi disponibilizado na página da Comissão Europeia.)



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