
Entre Margens
Eugénio Fonseca | 30/06/2025
Uma das preocupações emergentes suscitadas no Sínodo católico sobre a sinodalidade foi a situação e necessária renovação dos seminários e da tipologia formativa dos seminaristas. Decerto que esta é também uma questão que os bispos portugueses não deixarão de colocar nas suas próximas assembleias plenárias.
Creio que a falta de vocações impõe, há muito, esta reflexão, mas a mesma foi acelerada pelos frequentes apelos, feitos por muitos dos que deram contributos nas várias etapas preparatórias do Sínodo. Algumas das constatações estavam relacionadas com as disparidades formativas e os desafios hodiernos. Também reconheço que alterações têm de ser feitas e não podem demorar, porque os desafios do tempo atual não esperam e a Igreja tem uma missão irrenunciável no contributo a dar para uma sociedade mais humanista, onde o amor supera o egoísmo e qualquer modo de injustiça. Não se trata de uma utopia. É a missão principal que Jesus nos mandou, em Seu nome, realizar. Por isso, reconheceremos que seremos seus amigos (cfr. João 13,35). Assim, não pode estar ausente do plano de formação, na estratégia e pedagogia e da sua aplicação, o conhecimento das realidades terrestes, com particular incidência aquelas onde o Evangelho é rasgado. Importa que cada seminarista vá conhecendo as diferentes realidades vividas pelas pessoas em situação de pobreza para que, progressivamente, se estabeleça uma empatia que será muito proveitosa na futura ação pastoral. Este investimento da relação do seminarista com o pobre justifica-se, pois o que está a acontecer é que os padres das últimas gerações se focalizam mais na pastoral litúrgica e na catequização. Isto acontece porque grande parte das vocações germinaram “ao redor do altar” ou em movimentos vocacionados para as duas dimensões pastorais referidas.

‘Com um plano formativo, ao longo de toda a estadia no Seminário, ajudar-se-ia a acabar com a frase, sempre muito ouvida, de “a caridade ser o parente pobre da pastoral”.’ Foto: Papa Leão XIV saúda seminaristas e padres no seu Jubileu. © Vatican Media
Longe de mim fazer citações das Escrituras ou do Magistério da Igreja para fundamentar a incontornável importância do testemunho da caridade numa diocese e em cada paróquia. Os nossos bispos conhecem-nas bem. Apesar da ação desenvolvida pelas inúmeras instituições particulares de solidariedade social, eretamente canónicas, elas não esgotam todas as obrigações de proteção aos pobres. Por razões de sustentabilidade financeira, algumas delas nem conseguem cumprir o princípio da Doutrina Social da Igreja, que é a opção preferencial pelos pobres. Também é importante ter sempre presente que esta instância é um órgão subsidiário da pastoral social da paróquia, pois o meio principal é toda a comunidade cristã que, tal como acontece nos outros dois setores pastorais, é representada por pessoas que emanam da comunidade. Sabemos bem que, em muitos casos, existe, nomeadamente, um distanciamento entre os centros sociais paroquias e as comunidades cristãs. Sei de situações em que o pároco extinguiu, ou não criou, o Serviço de Ação Social Paroquial, a Cáritas Paroquial, o Grupo Paroquial de Ação Social… que tem o dever de uma maior proximidade às pessoas em situação de pobreza.
Com um plano formativo, ao longo de toda a estadia no Seminário, ajudar-se-ia a acabar com a frase, sempre muito ouvida, de “a caridade ser o parente pobre da pastoral”. Ouso deixar umas meras propostas que têm, apenas, como objetivo dar o meu modesto contributo para que o Reino de Deus esteja mais próximo de nós (cfr. Lucas 21, 31), a saber:
– Organizar um plano de formação sobre pastoral social a ministrar nos últimos três anos do curso;
– Levar ao seminário, em cada trimestre, alguém que viva (ou fale em vez de) em situação de pobreza e/ou de exclusão social, residente na diocese ou fora dela; no mesmo trimestre, mas noutro mês um representante de uma instituição que procure eliminar as causas desses problemas;
– Incluir nos estágios pastorais desempenho de tarefas em instituições de solidariedade canónicas ou não, que, para além do contacto com as tarefas de retaguarda, de direção ou administrativas, proporcione aos seminaristas o contacto direto, no terreno, com as pessoas em situação de pobreza, com os bairros ditos problemáticos, com zonas de habitação degradada, onde vivam imigrantes ou desempregados, de tal modo que o contacto com a pobreza seja um verdadeiro contacto com a pessoa, com o Pobre.
Na paróquia, o padre é quem preside ao anúncio da Palavra, à liturgia e à organização da caridade. Se algum pároco privilegia a proclamação da Palavra, pode fazer da comunidade uma escola; se a sua tendência é privilegiar a liturgia corre o risco de reduzir a vida da comunidade a ritualismos; uma paróquia que só dá relevo à dimensão social não passa de uma prestadora de serviços e ou a uma delegação da Segurança Social.
Para ser evangelizadora o pároco tem de criar condições para uma comunidade que tenha competências, no sentido de anunciar a Palavra de Deus; de saber louvar a Deus; e de dar credibilidade à Palavra que anuncia e do louvor que faz, através do testemunho da justiça e da caridade.
Eugénio Fonseca é presidente da Confederação Portuguesa do Voluntariado.
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