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quarta-feira, 2 de setembro de 2020

O não à eutanásia é o sim à vida

Cada vez mais caminhamos para a retrógrada e perigosa visão utilitarista da vida, onde a dignidade da vida humana é medida pela sua utilidade para a sociedade, ou seja quanto mais útil for uma vida humana para sociedade mais dignidade e direito a viver tem. Já quanto é menos útil para a sociedade, ou até só um «peso», essa vida tem menos direito a viver e menos dignidade. Isto é andar para trás no tempo.

 

Voltamos a 650 antes de Cristo, quando na Grécia, mais concretamente em Esparta, qualquer bebé espartano que seja deficiente é morto de imediato. Isto por não poder servir Esparta, por não poder ser útil a Esparta no trabalho reservado aos homens, o de ser soldado. É impedido ao bebé o seu direito de viver pela simples razão de não ser útil para o exército.

 

Mais recente do que a Esparta antiga é a Roma antiga, onde de 500 a.C a 391 d.C se praticava constantemente a eutanásia. Esta prática era comum entre as pessoas mais pobres. A Eutanásia era utilizada para doenças hoje do foro da normalidade e que são facilmente curadas, porém na altura doenças letais. Nesses casos de doenças então letais, os mais endinheirados desembolsavam fortunas para poderem ser tratados, ou para se lhes poder aliviar o sofrimento. Já aos menos endinheirados era-lhes inevitavelmente impingida a eutanásia, isto por não terem essa riqueza disponível.

 

Estes casos de não se poder ser tratado residem na ausência dos cuidados paliativos. O estado Romano não investia dinheiro para proporcionar a todos tratamentos que lhes aliviassem o sofrimento, ou que até os tratassem. Aproximamo-nos em muito desse tempo.


Mais recentemente e muito mais tenebroso do que na Roma antiga é o caso da Alemanha Nazi, o Terceiro Reich. Nele, a famosa propaganda de Goebbels que promovendo o programa Tiergartenstrasse 4 ia convertendo a população alemã à necessidade da prática da eutanásia àqueles que tinham doenças terminais ou incuráveis ou até que fossem somente deficientes, chamando-lhes de «pesos para o estado». Isto em troca de se conseguir tirar todas as famílias alemãs da pobreza.

 

É indiscutível o utilitarismo na visão Nazi da vida Humana e é também indiscutível a sua barbaridade, a propósito dessa mesma visão.

 

Ora é esta mesma visão utilitarista da vida que sucede nos dias de hoje, na qual por detrás de palavras bonitas como “liberdade” e “escolha” se esconde a verdadeira visão e o verdadeiro objetivo. A verdadeira visão é a visão já acima referida; a visão de que só uma vida útil para a sociedade é que é uma vida com dignidade e o verdadeiro objetivo é o objetivo de eliminar «os fardos» da sociedade.

 

A discussão a favor da eutanásia não gira em torno de direitos, não gira em torno do muito evocado direito a morrer. A luta contra eutanásia é assente em direitos, no direito à vida, no direito a ser tratado, no direito aos cuidados paliativos e no direito a morrer acompanhado com a dor aliviada, com amor à sua volta, a verdadeira morte digna.

 

A luta contra eutanásia, o não à eutanásia é o sim à vida e à sua dignidade inviolável. É perceber que a eutanásia não acaba com o sofrimento, a eutanásia acaba com a vida da pessoa. Dizer sim à eutanásia, é cair na tentação do egoísmo social e por isso abdicar da nossa sociedade humanista e da sua solidariedade inerente. A sociedade solidária foi uma conquista enorme da época contemporânea, não a podemos negar, esquecendo-a e contradizendo-a.

 

O que um doente terminal num sofrimento abismal precisa é de amor e de carinho, não é que lhe deem a escolher entre a sua morte e o sofrimento.

Manuel Maia e Simões 




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