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quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Quando se Gosta de Alguém Gosta-se Mesmo

A minha querida madrinha disse-me, um dia, algo que não esqueço. “Quando se gosta de alguém, gosta-se mesmo”. Na realidade, é uma pessoa sempre disponível para nos ouvir e aconselhar. Eis, pois, face à distância que nos separa, porque ousei desabafar um pouco, através de uma “carta”, porque sei que me ouve sempre. Na realidade, tenho a sensação que estive presente neste mundo, quase de passagem, apesar do muito tempo que já vivi. Parece-me que muitas pessoas não me terão compreendido ao longo da vida. Culpar quem? Talvez tenha escondido demasiado o meu modo de sentir, de pensar, de agir, de transmitir todo o amor à família e ao próximo que ficou guardado, frequentemente, no meu coração. Por outro lado as coisas menos boas não são, de todo, para partilhar, dado que já existem na vida, preocupações suficientes. Torna-se necessário recriar a esperança. Até quando?

Sim, até quando se consegue guardar tudo no nosso coração. A frase dos Atos dos Apóstolos refere: “A felicidade está mais em dar do que em receber”. Este dom, encontra-se genuína e profundamente no coração humano: cada pessoa percebe o desejo de entrar em contacto com os outros e realiza-se a si própria quando se dá livremente aos outros… No entanto, o espírito do mundo altera tantas vezes a inclinação interior para o dom desinteressado de si mesmo, induzindo as pessoas a satisfazer os próprios interesses particulares. A exagerada ambição de possuir impede também a criatura humana de abrir-se ao Criador e aos seus semelhantes…, como diz S. Paulo a Timóteo: “A raiz de todos os males é o amor ao dinheiro, por causa do qual alguns se desviaram da fé e se enredaram em muitas aflições”. A exploração do homem, a indiferença pelo sofrimento alheio…, são alguns dos resultados da ambição do ganho. Frente ao triste espetáculo da persistente pobreza que atinge boa parte da população mundial, como não reconhecer que o lucro perseguido a todo o custo e a falta de atenção efetiva e responsável pelo bem comum concentram uma grande quantidade de recursos nas mãos de poucos, enquanto o resto da humanidade sofre na miséria e no abandono? (S. João Paulo II).

É preciso um grande amor, um enorme espírito de sacrifício, para interiorizar e guardar o que de algum modo pode magoar os outros. Depois, a vida encarregar-se-á, um dia, de fazer ver a verdade, o quanto sofremos, caminhando sobre o tapete da incerteza, procurando manter tão-somente alguma dignidade a as boas recordações. 

Madrinha, ouso escrever-lhe estas palavras, porque sei que me compreende. Felizmente que a narrativa é silenciosa e é apenas divulgada se nós assim o quisermos. Posto isto, este momento constitui mais um desabafo: não há dor maior do que amar alguém que, em dado momento da nossa vida pode partir, rumo ao infinito, devido a um problema grave de saúde. Mas na realidade todos partiremos um dia. Caminhamos para a morte desde o dia do nosso nascimento. Sendo assim porque nos é tão difícil aceitar o que sabemos que é inevitável a curto, médio ou longo prazo, quando a nossa hora chegar?

Peço-te meu Deus, através da oração que me poupes a mais um desgosto. Não há dor maior que uma mãe, irmã, esposa possa sentir, do que ver os seus familiares sofrerem, sem nada poder fazer: unicamente continuar a dar todo o seu amor incondicional, ainda que às vezes incompreendido. 

Madrinha, ambiciono que Jesus seja o meu porto seguro, o meu amparo na dor, a minha alegria neste caminhar inseguro, em que busco o conforto de um abraço amigo, o afeto, alguma vez perdido, que preencha o meu coração com o Seu amor sobrenatural, para que o amor terreno possa ser dedicado ao próximo, a fazer o bem. Que seja como uma pedra atirada ao lago, que provoca um círculo, logo outro e ainda outro e assim, continuamente, até conseguir produzir os seus frutos. E que todos sejamos também sempre apoiados por Maria, nossa Mãe do Céu.

Madrinha, acabamos de entrar na Quaresma. O Papa Francisco na sua mensagem para este ano escreveu; “Na Divina Comédia, ao descrever o Inferno, Dante Alighieri, imagina o diabo sentado num trono de gelo; habita no gelo do amor sufocado… Como se respira o amor em nós?... O que apaga o amor é, antes de mais nada, a ganância do dinheiro, depois dela, vem a recusa de Deus e, consequentemente, de encontrar consolação n´Ele… Tudo isto se traduz em violência, que se abate sobre quantos são considerados uma ameaça… : o bebé nascituro, o idoso doente, o hóspede de passagem, o estrangeiro… A própria criação é testemunha silenciosa desse resfriamento do amor… Convido, sobretudo os membros da Igreja, a empreender com ardor o caminho da Quaresma… Se por vezes parece apagar-se em muitos corações o amor, este não se apaga no coração de Deus. Ele dá-nos sempre novas ocasiões para podermos recomeçar a amar”.

Este excerto da mensagem do Papa, Madrinha, ajuda-nos a recriar a esperança. Não fique preocupada. Como sempre, foi unicamente um desabafo com alguém que sei que me ama e me compreende. “Quando se gosta de alguém, gosta-se mesmo”. Estou ansiosa por a rever.

Santa Maria, Esperança Nossa, rogai por todos nós, permitindo que o nosso coração se volte a inflamar de esperança, de fé, de amor, de bondade, de perdão e de misericórdia. 

Maria Helena Paes









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