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sábado, 11 de junho de 2016

Palavra e Pão 28 – X Domingo do Tempo Comum

Coração católico

Porque será que os líderes dos países ricos da Europa têm medo de acolher os refugiados? Por razões económicas, políticas, sociais ou culturais? Penso que é sobretudo porque não têm um coração católico e acham que é perigoso embarcar em idealismos e sentimentalismos que acabarão por nos sobrecarregar com os problemas dos outros quando já não sabemos como lidar com os nossos. Será o Papa Francisco um idealista irresponsável ao fazer-se arauto incansável e defensor ativo da causa dos refugiados? Quem vive a partir do mistério da Cruz gloriosa do Senhor tem um olhar mais extenso, vê para além do imediato e não teme os inevitáveis problemas e sofrimentos porque vive habitado pela certeza de que o Bem e a Verdade, tantas vezes combatidos e espezinhados, são fecundos e acabam por dar frutos bons, mais tarde ou mais cedo.

Ser católico, mais que um rótulo e um distintivo, é uma graça e um programa para a nossa vida. Católicos pela graça do Batismo que recebemos, somo-lo efetivamente quando nos tornamos imitadores de Deus e realizamos as suas obras. Começamos a ser católicos professando a fé da Igreja Católica: reconhecemos e aceitamos como princípio, fundamento e dinamismo da nossa vida aquele amor do Deus único, Criador e Providência do Universo, Pai amoroso para com todas as suas criaturas que faz nascer o seu sol sobre bons e maus e chover sobre justos e injustos (Mat.5,45) e quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da Verdade (1Tim.2,4). Esse amor criador foi-nos revelado e oferecido por Jesus Cristo, Verbo Eterno do Pai que por amor de nós e para nos salvar desceu do Céu e morreu na cruz carregando com os pecados do mundo inteiro e de cada um de nós. Ressuscitado e glorificado pelo Pai, enviou o Espírito Santo para dimensionar o coração e a vida dos que n’Ele acreditam por esse amor católico, universal, que não conhece fronteiras, e podermos participar da comunhão divina do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, em cujo nome fomos batizados, e testemunhá-la no meio do mundo não apenas por aquilo que dizemos mas sobretudo pelas obras que realizamos e pela nossa maneira de viver. Sem o Espírito Santo não é possível termos um coração católico, possuído pela caridade de Deus, pois o egoísmo individual ou de grupo nos fecha aos outros e nos leva a vê-los como ameaça às nossas seguranças. 

Na 1ª leitura da missa deste X domingo do Tempo Comum (1R 17,17-24) vemos como Deus recompensou a hospitalidade oferecida ao profeta Elias, estrangeiro em Sidónia, pela viúva de Sarepta, não só providenciando-lhe alimento, mas devolvendo-lhe vivo o filho que tinha morrido. Já no livro do Génesis vemos que Sara recebe o dom da fecundidade graças à hospitalidade oferecida por Abraão a Deus que o visitou na figura daqueles três estranhos que se aproximaram da sua tenda. Onde houver acolhimento aos estrangeiros há vitória sobre o egoísmo e manifesta-se a vida e a ressurreição. A falta de hospitalidade, sejam quais forem as razões aduzidas para a justificar, denuncia que não há lugar para o outro, não há lugar para Deus, fonte da vida e do amor. E sem Deus as pessoas, fechadas em si mesmas e nas suas razões, ficam egoístas e estéreis, sem futuro. 

Tomemos o Evangelho deste domingo como uma parábola. Chamemos ao filho morto da viúva de Naim, futuro de Portugal e da Europa. Perguntemo-nos que futuro pode haver para esta sociedade voltada sobre si mesma que não tem outro horizonte além do bem-estar egoísta num hoje sem raízes nem rebentos, esquecido do passado e hipotecando o porvir para ter mais, para gozar mais e suplantar os outros, seja de que maneira for. A corrupção tem a sua própria lógica, mas devemos perguntar-nos se é irreversível esta situação, se pode alguém fazer parar este funeral e se, ao menos alguns poderão escutar a Palavra que tem o poder de os restituir à vida.

Compadecido daquela mãe, conta o Evangelho, Jesus disse-lhe uma palavra de consolação, tocou no caixão e o enterro parou. E a sua palavra poderosa arrancou das garras da morte aquele jovem que se sentou e começou a falar. O Senhor entregou-o de novo a sua mãe, e o funeral deu lugar à festa e à glorificação de Deus que visitou o seu povo (Luc.7,16). Parece que também hoje, por meio de acontecimentos violentos, o Senhor Se está aproximando e tocando no caixão do morto. Será que vão parar aqueles que o transportam? Esses, que a este funeral chamam progresso e que apenas se ouvem a si mesmos, parecem imparáveis e esforçam-se por acelerar a marcha do enterro… 

Somos cristãos. Somos católicos. Seja católico o nosso coração! O Senhor revelou-nos os mistérios do Reino que sempre escondeu e continua a esconder aos sábios e aos inteligentes do mundo, confiou-nos o mesmo Evangelho anunciado por Paulo, Evangelho que não é de inspiração humana (Cf. Gal 1, 11) e pôs em nossos lábios a mesma Palavra vivificante com que Elias ressuscitou o filho da viúva de Sarepta. Dinamizados pela fé, pela esperança e pela caridade, sabemos de onde vimos e para onde vamos. Sabemos que o futuro da humanidade não está na descrença nem no hedonismo materialista, não está na desesperança nem no egoísmo. Porque conhecemos a vitória do Senhor Jesus Cristo sobre a morte e sabemos que Ele tem o poder de dar vida aos mortos, não somos pessimistas. Rejeitamos também o otimismo compulsivo que, como escreveu Bento XVI, é muitas vezes a máscara do desespero e procuramos ser realistas, procuramos ver a realidade à luz da fé. Acreditamos que o anúncio do Evangelho tem poder para dar vida nova a este país e a esta Europa que estão a ser levados à sepultura pelo egoísmo e pela corrupção, pelo materialismo e pelo ateísmo e, por isso, fazemos ressoar a Palavra criadora e recriadora do Verbo de Deus: jovem, Eu te ordeno, levanta-te! (Lc 7, 14).


+ J. Marcos


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