O mundo paga os pecados que tem e os que não tem na mão de psicopatas. Isto não é nenhuma novidade, ainda que desconheça a existência de trabalhos académicos que possam embasar afirmação de tamanho arco. Tenho, porém, convicta intuição, para preservar alguma prudência, de que este comportamento patológico tem a idade do homem na Terra. Já passaram pelo palco atores insanos como Átila, Nero, Napoleão e Hitler. Alguns mereceram homenagens pomposas, como o general corso, cujos restos repousam numa tumba portentosa em Paris.
Há outros desconhecidos do grande público, como os que destruíram o sítio arqueológico de Palmira, na Síria, em nome do Estado Islâmico, com o objetivo de apagar sinais de subserviência da região. Bem antes se esfumara a estrela diabólica de Pol Pot, com seu plano de exterminar a civilização. No Peru um maluco quase reeditou a chacina cambojana. Abimael Guzmán e o seu Sendero Luminoso fazem parte do firmamento de humanos desvarios, verdadeiras impressões digitais da barbárie de que é capaz a humanidade.
O que pensar sobre isto? Que a história nos autoriza a suspeitar fortemente que a civilização é apenas um tênue verniz. Quando encaramos a natureza selvagem que subsiste em cada um, sem máscaras ou subterfúgios, fica nítido que precisamos de permanentes demãos deste verniz da diplomacia, da formalidade e do entendimento. Para frear nossa estupidez e evitar o caos.
Nunca fui admirador de grupos musicais que gritam refrãos e passam a música inteira cantando praticamente a mesma coisa. É algo muito aborrecido, que deixa a musicalidade de lado e dá uma canelada na harmonia. Coloco nesta categoria os Rolling Stones, que não gosto de ouvir em momento algum. Pra piorar, além da barulheira, tem como líder um vocalista rebolativo. Acho estes camaradas muito sem graça, mas não desconheço que contaminam e encantam muita gente. Mick Jagger, com a cara amarrotada pelos anos e o corpo esquelético, me faz lembrar o professor Abronsius, que contracena com Polanski e Sharon Tate em A dança dos vampiros, um clássico do gênero na linha satírica.
Se há vampiros no cinema, também os há no capitalismo. Quando desembarcavam no Brasil, os técnicos do FMI vasculhavam nossas contas públicas, para logo depois recomendarem remédios amargos e um pacote padrão. Era a pílula preta do capitalismo, recomendada para resfriados, dores de cabeça ou câncer. Nos países que aderem ao sistema hegemônico capitalista, logo chegam as pontas de lança do domínio avassalador, que inclui lanchonetes, música pop e a turminha da Disney. Cuba é o exemplo mais recente. Suprimiu a liberdade de seu povo, exportou a revolução para a América Central e África e serviu de modelo para a esquerda sulamericana, que incensou o modelo com fervor religioso, adotando Fidel como o sumo sacerdote. Já fazia tempo, porém, que o motor cubano vinha queimando óleo 40 ...
O resultado contemporâneo do regime cubano, manifesto no atraso da economia, na pobreza do povo e da infraestrutura do país, teve sua representação máxima por um avião aterrissado. No alto da escada, eles, os Rolling Stones. Foi a tradução fotográfica do “Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas”, fazendo valer para Cuba o que Sérgio Buarque de Holanda escreveu para o Brasil: “Trazendo de países distantes nossas formas de vida, nossas instituições e nossa visão do mundo e timbrando em manter tudo isso em ambiente muitas vezes desfavorável e hostil, somos uns desterrados em nossa terra”. Foi uma rendição do fracasso. Cuba remou, remou e morreu na praia, deixando muitas viúvas brasileiras pelo caminho.
Como deixar-se fisgar por ideologias quando já se tem anos de estrada? Como embriagar-se com o licor das utopias? O psiquiatra inglês Anthony Daniels, mais conhecido pelo pseudônimo Theodore Dalrymple, resumiu sua decepção com a política em A pobreza do mal: “Foi na América Central e do Sul que aprendi aquilo que talvez tivesse sido uma conclusão óbvia extraída dos livros de história, particularmente a da Rússia do séc. XIX, de que a violência política prolongada não é a expressão espontânea da frustração, da pobreza ou da revolta contra a injustiça, por mais gritantes que sejam, mas sim de disputas entre elites que competem entre si e entre facções ansiosas por se tornarem uma delas”. Alguém se habilita em desmentir? Cuba se foi. Teve o fim melancólico das fantasias. Nada resiste onde não existe liberdade.
J. B. Teixeira |
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