Recentemente, li algures esta frase que dá o título ao artigo, e acrescentava ainda que, para além de pararem de nos dar coisas, nos começavam a tirar. Na altura pensei que era um bom mote para escrever um artigo. Na realidade com a aposentação perdemos algumas regalias, contudo ganhamos outras. No entanto cada caso é um caso. Sempre ouvi dizer que se tornava necessário preparar a reforma, tanto a nível financeiro, de saúde, bem como a nível familiar e social. Importava que, quando chegasse essa altura, substituíssemos, se possível, o trabalho diário, por alguma atividade de voluntariado onde pudéssemos ser úteis. Também uma maior disponibilidade para ajudar a família, se fosse caso disso, com os netos, já que a vida hoje em dia exige muito a este nível aos casais mais jovens. Também manter o nosso círculo de amigos com os quais nos encontramos com alguma regularidade, seja para socializar, viajar, fazer alguma prática desportiva, caminhadas, estudo, entre outros, já que depende do estilo de vida e apetências de cada pessoa. Posto isto o vazio não seria tão sentido e continuávamos a contribuir com os nossos conhecimentos e experiência adquirida, em prol do bem-estar da sociedade. Na prática, tudo o que acabo de expor é extremamente válido: é bom programar por ter um efeito preventivo. Para uns resulta, para outros nem por isso, já que o futuro a Deus pertence e não sabemos o que nos aguarda…
Uma amiga minha confidenciava este fim-de-semana da Divina Misericórdia: “Miserere!”. Tarde me apercebi que alguns daqueles em que confiei, ajudei, me dediquei de corpo e alma, acreditando piamente que eram meus irmãos de coração, na realidade só se encontravam presentes nos bons momentos. Na realidade, irmão, amigo, é aquele que partilha connosco os bons e maus momentos. O tempo, as vivências, concedem-nos a maturidade para tudo isto aceitarmos, ganharmos experiência e oferecermos a Deus as nossas desilusões e desgostos. Consolam-nos as seguintes frases. “Adorai o Senhor porque Ele é bom, o Seu amor é para sempre”! Ou ainda: “Todo o que nasce de Deus vence o mundo!”. São Bernardo dizia que ia buscar as suas forças ao coração de Jesus de onde sai sangue e água”. Também Santa Faustina canonizada por S. João Paulo II no ano de 2000, na recitação do Terço da Divina Misericórdia, após cada mistério do terço acrescentou, segundo indicação de Jesus, (que disse a Santa Faustina que tudo o que fosse pedido por meio do Terço da Divina Misericórdia seria concedido), a seguinte frase, entre outras iniciais e finais: “Oh sangue e água que jorrastes do coração de Jesus como fonte de misericórdia para nós: eu confio em Vós!”. Esta santa referiu no seu diário que o propósito das jaculatórias e orações é obter misericórdia, confiar na misericórdia de Jesus e mostrar misericórdia para com os outros.
Veio-me ao pensamento a necessidade de todos possuirmos e usufruirmos da misericórdia de Jesus. Olhar para o outro que se encontra ao nosso lado, muitas vezes a sofrer em silêncio por diferentes motivos entre eles a falta de saúde, o falecimento de um ente querido, o volume de trabalho que as famílias, com crianças pequenas, lutam no dia-a-dia para levar a vida em frente, as dificuldades financeiras, de habitação, de falta de trabalho, ou trabalho precário, a guerra, os atentados e um sem fim de acontecimentos para os quais muito carecemos da Misericórdia Divina a nível mundial.
Recentemente o Papa Francisco na exortação apostólica “Gaudete et Exsultate”, dedicada à santidade no mundo contemporâneo e que tem como objetivo “fazer ressoar, mais uma vez a chamada à santidade, procurando enquadrá-la no contexto atual, com os seus riscos, desafios e oportunidades. Para ser santo não é necessário ser bispo, sacerdote, religiosa ou religioso”. O Papa gosta de o ver “nos pais que criam os seus filhos com tanto amor, nos homens e mulheres que trabalham para trazer o pão para casa, nos doentes, nos idosos, que continuam a sorrir… O mundo não quer chorar, prefere ignorar as situações dolorosas, cobri-las escondê-las. Na obsessão por nos divertirmos, acabamos por estar excessivamente centrados em nós próprios, nos nossos direitos e na exacerbação do tempo livre para gozarmos a vida. Será difícil darmos a mão a alguém que está mal. Se não cultivarmos uma certa austeridade, se não lutarmos contra essa febre que a sociedade de consumo nos impõe para nos vender coisas, acabando por nos transformar em pobres insatisfeitos que tudo querem ter e provar”.
Como o Papa Francisco tem razão! Às vezes criamos necessidades que podíamos muito bem dispensar. Como S. Paulo afirmou relativamente ao desprendimento, porque é disso que se trata: “Sei viver na pobreza e na abundância”. O desprendimento torna-nos mais fortes ajudando-nos quando nos confrontamos por opção ou por necessidade com alguma carência económica seja por um revés da vida, por perda de rendimentos devido a vários fatores que possam surgir. Vejamos a situação dos refugiados, a título de exemplo. Com a idade a avançar, quantos idosos, passam por dificuldades, sofrem do isolamento, da solidão, das doenças próprias da idade, mas com uma grande riqueza ou seja, a juventude acumulada, que gera conhecimento, experiência de vida, mas que também carece de atenção e de amor, e volto ao título do artigo: Chegámos à idade em que param de nos dar coisas, mas que começam a tirar-nos. Não deixemos de apoiar, dentro das nossas possibilidades, quem mais precisa.
Maria Helena Paes |
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