Entrevista com o professor Zamagni, consultor do dicastério Justiça e Paz: a Doutrina Social da Igreja é um paradigma da antropologia cristã
Roma, 02 de Outubro de 2014 (Zenit.org) Sergio Mora
O professor e economista Stefano Zamagni, consultor do
Pontifício Conselho Justiça e Paz, presente no congresso desse mesmo
dicastério em Roma, explicou a grande contribuição do papa Francisco à
Doutrina Social da Igreja ao levar esse tema ao grande público. Zamagni
lamentou que os “instrumentalizadores de sempre” queiram aplicá-la como
se fosse um modelo político e não um paradigma.
Ele conversou hoje com ZENIT depois de dissertar na XXVIII Reunião
Plenária do Pontifício Conselho Justiça e Paz, pouco antes de os
participantes serem recebidos pelo papa Francisco.
ZENIT: Qual é a contribuição do papa Francisco à Doutrina Social da Igreja?
Prof. Zamagni: O grande mérito do papa Francisco é ter levado o tema
da Doutrina Social da Igreja, que é sempre esse e não pode ser outro no
tocante aos princípios, ao nível, digamos, das massas. Antes era um tema
que ficava no nível cultural e científico e que, portanto, era objecto
de atenção das pessoas cultas. Hoje o tema está sendo levado à base e
entrando nos ouvidos dos empresários, dos gerentes, dos funcionários.
ZENIT: Como podemos definir a filosofia do papa Francisco?
Prof. Zamagni: A filosofia do papa Francisco é a do realismo
histórico. Ele afirma que a Doutrina Social da Igreja é um paradigma,
não um modelo; lamentavelmente, os instrumentalizadores tentam
interpretá-la como se ela fosse um modelo. E dizem: “o papa, quando diz
isto, se refere a isto, diz que esse modelo é proibido...”. Não, porque o
papa não vai ao nível dos modelos, mas ao nível dos paradigmas.
ZENIT: Pode explicar por que ela é um paradigma?
Prof. Zamagni: Paradigma significa um olhar para a realidade, e,
neste sentido, a obra do papa deixará marca, porque, de uma vez por
todas, ela deixará claro que o cristianismo é uma religião universal,
não uma religião étnica, adequada e interpretada com específicas
referências a uma determinada realidade; ela pode se encarnar em
qualquer contexto. Eu diria que um sinal prático disto é a forma como
ele está mudando a composição orgânica dos membros da cúria, que está
sendo cada vez mais internacionalizada em comparação com o passado.
ZENIT: Você falou também de um terceiro ponto...
Prof. Zamagni: Não basta intervir nos mecanismos da distribuição da
riqueza, mas também nos mecanismos da produção da riqueza. Porque se eu
intervenho só post factum, ou seja, depois que a renda foi obtida, para
torná-la mais equitativa, isso não é mais suficiente hoje. Já foi, mas
agora a economia se tornou global. É necessário intervir no momento em
que a riqueza é produzida de acordo com critérios de justiça e de
equidade.
ZENIT: Há quem diga que o capitalismo é intrinsecamente perverso...
Prof. Zamagni: São discussões dessas pessoas que pensam que o papa
quer atacar um modelo em vez de outro, quando, na realidade, o que
interessa ao papa é afirmar um paradigma que é o da antropologia cristã.
ZENIT: O papa insiste sempre na solidariedade?
Prof. Zamagni: A solidariedade é uma das quatro colunas da Doutrina
Social da Igreja: a primeira é a centralidade da pessoa; a segunda é a
solidariedade; a terceira, a subsidiariedade; e a quarta é o bem comum.
Então não é dito nada novo. O novo é aplicar isso à realidade actual.
ZENIT: E quem faz essas interpretações?
Prof. Zamagni: São os instrumentalizadores de sempre.
(02 de Outubro de 2014) © Innovative Media Inc.
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