Ao longo do século XVII foi-se dando uma mudança profunda em
muitos espíritos, nomeadamente por influência de ideias anglo-saxónicas - o
deísmo, de ideias francesas - o racionalismo, as quais vieram a culminar no
iluminismo anti-cristão do século XVIII.
A França, principal epicentro deste cataclismo,
vertiginosamente adoptou as ideias defendidas por Voltaire, declarando uma
guerra filosófica contra qualquer religião positiva, nomeadamente o
cristianismo, metamorfoseando os espíritos intelectuais da época e eivando-os
duma forte virulência.
Acabar com a religião cristã foi a obsessão constante deste filósofo
iluminista que escreveu: “Cristo necessitou de doze Apóstolos para propagar o Cristianismo;
eu vou demonstrar que basta um só para o destruir”.
A esta vertigem não foram estranhas a corrente hedonista dos
libertinos, protagonizada por Saint-Evremont, a crítica radical de Espinoza
contra a Bíblia e a Enciclopédia de Diderot e D´Alembert, com uma orientação
intelectual radicalmente hostil ao Cristianismo.
“O Cristianismo é uma religião revelada, com um conteúdo de
verdades de ordem sobrenatural às quais o crente deve aderir, não pela via da
experiência directa, mas da fé”.
“A substituição da Religião revelada por uma mera religião
natural foi nesse tempo a pretensão do Deísmo, que, a partir da Inglaterra, sua
pátria de origem, se propagou à França e à Alemanha. O deísmo não negava Deus –
como o ateísmo; esfumava-O e afastava-O do homem. O deus dos deístas era uma
construção racional, amiúde panteísta, totalmente à margem da Revelação. O
deísmo informou a Maçonaria, cujas primeiras lojas se fundaram na Inglaterra,
nos começos do século XVIII”. (História Breve do Cristianismo, de José
Orlandis)”
É verdade que em França este “espírito filosófico” foi
património de uma minoria dirigente, pois o povo conservava a sua religiosidade
cristã, mas aquela minoria determinou a ideologia da nova época da história
europeia, que começou com a Revolução Francesa de 1789.
Com um entrelaçado de causas sociais, ideológicas e
políticas, um facto é que a Revolução começou com uma Procissão. No dia 2 de
Maio de 1789, uma Procissão Solene presidida pelo Rei Luís XVI e pelos
representantes dos três estados, de círio na mão, acompanhavam devotamente o
Santíssimo Sacramento na abertura dos Estados Gerais, mas poucas semanas
depois, o cenário mudou radicalmente e o processo revolucionário avançou por
outro lado.
Porém, os piores anos vieram entre 1793-1794, o Terror, as
perseguições anticatólicas atingiram nesta altura o seu ponto mais rubro, foram
milhares as vítimas desta tentativa de apagar da vida francesa qualquer traço
cristão. Até o calendário foi substituído por um “calendário republicano” e na
Catedral de Notre Dame, no dia 10 de Novembro de 1793, foi entronizada a
“Deusa-Razão” e instituído por Robespierre o culto do “ Ser Supremo”, sistemas de crenças baseadas nas ideias racionalistas,
estabelecidos na França, e que pretendiam substituir o cristianismo
durante a Revolução Francesa.
Anos mais tarde, no Directório Jacobino (1797 – 99)
recrudesceu esta ânsia de morte ao catolicismo, os franceses ocuparam Roma e
proclamaram a Republica Romana. O Papa Pio VI velho e doente, foi deportado
para Siena, Florença e, finalmente para a cidade de Valence-sur-Rhône, em França, onde a 29 de Agosto de 1799 veio a
falecer com oitenta e um anos de idade. Alguns revolucionários exaltados
proclamaram que tinha morrido o último papa da Igreja.
É curioso que este episódio vai ser repetido no reinado de
Napoleão, quando este tenta instrumentalizar a Igreja e não teve apoio
pontifício. Face a esta reacção o imperador reduz o Papa Pio VII a prisioneiro
e deporta-o para Savona, em 6 de
Julho de 1809. Perante a sua negativa de não sancionar os decretos de um pseudo
- concílio reunido em Paris (1811), Napoleão ordenou a sua transferência para
França, onde lhe destinou como residência o Palácio de Fontainebleau. Em 1815
Pio VII regressou definitivamente a Roma, onze dias mais tarde – 18 de Julho –
um novo nome se incorporou à História Universal – Waterloo.
Não obstante este cenário de perseguições ao Cristianismo, as
quais se tornaram ainda mais acintosas no século XIX, fruto de filosofias e
ideologias marxistas e anarquistas, com consequente aplicação prática nos
regimes totalitários – nazismo e comunismo – que flagelaram a Europa no passado
século XX, e uma veemente perseguição frontal, indirecta, camuflada, vinda de
sectores político, mediáticos e outros, nestes dias da nossa história, a Santa
Madre Igreja renasce a todo o momento e por todo o mundo.
Apráz-me recordar o
sábio conselho de Gamaliel, numa das reuniões do Sinédrio, quando alguém propôs
matar os Apóstolos para evitar o contágio das suas doutrinas: “Agora, pois, eu
vos aconselho: não vos metais com estes homens. Deixai-os! Se o seu projecto ou
a sua obra provém de homens, por si mesma se destruirá; mas se provier de Deus,
não podereis desfazê-la. Vós vos arriscais a entrar em luta com o próprio Deus”
(At 5,38-39).
Maria Susana Mexia |
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