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sábado, 22 de julho de 2017

A Natureza, a Janela e as Recordações

Aqui me encontro num local extremamente tranquilo, rodeada pela natureza, a ouvir o chilrear dos pássaros, sentada debaixo de um eucalipto centenário e rodeada de muitas mais árvores e flores, numa quinta encantadora que me faz recordar o passado. Como os tempos mudaram! O tempo passou. O decorrer dos anos trouxe novas realidades que são tão diferentes, que jamais conseguiria sonhar. Não são boas nem más. Não ouso classificar. Pois é, com o tempo alcançamos mais maturidade, encaramos os acontecimentos de um modo diferente. Aceitamos o passado que não podemos modificar e perspetivamos o futuro, vivendo intensamente o tempo presente, pois não sabemos se o dia de amanhã chegará. Sinto-me, como se estivesse sentada perto de uma janela, já agora com bancos laterais, como havia antigamente na Quinta. Essa janela ao abrir transporta consigo memórias e vivências. O intenso cheiro da caruma, como o das pinhas e folhas caídas parecem querer abrir a janela e transportar-me ao passado. É tão forte esse sentimento que não ouso resistir…

Na realidade ao passar pela janela, encontro-me a reviver uma situação decorrida há muitos anos atrás. Desta vez também numa Quinta, mas sentada debaixo de um carvalho com pinheiros por perto. As crianças brincam. Há muito para observar na quinta, desde pintainhos, patos, galinhas, fruta para apanhar… À hora do lanche a Maria toca a trompeta e vêm todos a correr para lanchar. Recordo os copos de plástico de várias cores muito fortes cheios de leite que desaparecia num ápice. Os pãezinhos com manteiga também. Era uma alegria. A Maria perguntava se queriam mais; claro que havia sempre quem repetisse. Depois era chegado o momento de servir o chá com uns scones maravilhosos como só ela sabia fazer. A compota, também feita na quinta, fazia as nossas delícias. E por ali ficávamos a partilhar segredos, a observar as crianças, a usufruir de uma excelente tarde de verão. Foram bons momentos que não se voltarão a repetir em virtude de os familiares de mais idade já terem partido, bem como a Maria. A quinta também deu lugar a um condomínio. Fechou-se um ciclo. Mas é bom poder recordá-lo!

Os vários ciclos de vida parecem agora querer entrecruzar-se. Vejo-os com alguma nitidez e clareza. As memórias são importantes, constituem uma riqueza e ajudam a formatar a nossa personalidade. Como refere James Allen: “Um homem não pode diretamente escolher as suas circunstâncias, mas ele pode escolher os seus pensamentos, e assim indiretamente, mas, com toda a certeza, moldar as suas circunstâncias”. Como é gratificante poder à distância recordar os diferentes ciclos. Cada um com a sua peculiaridade, ou seja, a mesma pessoa com diferentes vivências em diferentes momentos. Em cada ciclo teve de lutar para ultrapassar vários medos, fantasmas, inseguranças, constrangimentos, que depois ficaram devidamente guardados no coração para mais tarde recordar. Entretanto continuamos abertos a novos acontecimentos e realidades numa aprendizagem constante que a vida acarreta. Não devemos de todo fechar a janela para o mundo e encerrarmo-nos em nós próprios apesar de toda a incerteza que possa trazer caminhar sobre o tapete do desconhecido, que às vezes se revela duro e rochoso, outras, coberto de flores e de sorrisos, de acontecimentos positivos. É a vida a passar... Somos os construtores do nosso destino e, se Deus quiser, para o bem.

Hoje acordei muito cedo. Encontro-me sentada ao lado da janela de um avião. Estou a partir rumo ao futuro, com tudo o que ele me tem reservado. Não posso é ficar parada neste novo ciclo da minha vida à espera que as coisas aconteçam. Se eu não lutar, não tenho quem o faça por mim. Torna-se necessário rentabilizar a nossa energia, usufruir de tudo o que nos rodeia, enquanto temos saúde e energia para o fazer sem perder de vista o horizonte, porque a porta do céu é estreita e, se possível, é onde permaneceremos eternamente. Esta vida é uma mera passagem para se alcançar o infinito.

Sendo que hoje se celebra o dia de Nossa Senhora do Carmo da qual sou fiel devota, não resisto em narrar esta secular tradição. No dia 16 de Julho de 1251, São Simão Stock suplicava a Nossa Senhora a sua ajuda. A Virgem apareceu-lhe, trazendo o Escapulário nas mãos referindo: Recebe, meu filho, este Escapulário da tua Ordem, como sinal distintivo da minha confraria e selo do privilégio que obtive para todos aqueles que, no decorrer dos séculos, usem o seu escapulário. A Virgem prometeu aos que vivessem e morressem com o escapulário – ou com a medalha, (devidamente abençoada) do Sagrado Coração e da Virgem do Carmo que o substitui – a graça de obterem a perseverança final, isto é, uma ajuda particular para se arrependerem nos últimos momentos da sua vida, se não estiverem em graça. O Papa João Paulo II afirmou que quem o recebe usufrui de constante proteção da Santíssima Virgem, não só ao longo do caminho da vida, mas também no momento de passagem para a plenitude da glória eterna…

Termino observando o que me rodeia através da janela do avião que se encontra a uma altitude de cruzeiro, logo, bem alto, só me permitindo ver nuvens, mas com algumas abertas. Por analogia pensei no futuro, também ele escondido sendo necessário enfrentá-lo. O que quer que venha a acontecer neste dia, pelo menos teve o mérito e a virtude de lutar por uma nova causa com muito amor, empenho e dedicação. O resto virá por acréscimo. O futuro a Deus pertence. 

Maria Helena Paes



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