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quarta-feira, 23 de março de 2016

Uma só família humana

Festejámos há pouco tempo o dia de São José que é também o dia do Pai, um dia de festa em família em que se lembram todos os Pais presentes ou ausentes.

É justamente nos dias festivos que somos mais intensamente impelidos a olhar em redor, para além do nosso círculo familiar mais restrito e neste momento a nossa atenção vai inevitavelmente para o drama das famílias nos países em guerra.

Assistimos ao calvário dos refugiados que vemos chegar todos os dias em péssimas condições e não esquecemos o sofrimento daqueles que ficaram no seu país. Afinal, somos uma só família humana e sabemos que todos têm o direito de viver em paz e a prioridade será sempre permanecer na própria pátria desde que aí encontrem as condições para a realização das suas capacidades e aspirações. Neste momento tal não é possível para um número crescente de pessoas e famílias inteiras que são obrigadas a “fugir”, a abandonar tudo e procurar uma vida nova longe do lar. E o mais preocupante é que este problema não terá solução enquanto a guerra persistir.

A comunidade internacional, desde 1951, assumiu compromissos bem determinados com o Estatuto do Refugiado que especifica e garante os seus direitos com base na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Certamente, com um forte empenho de todos e evitando o risco do mero assistencialismo, será possível encontrar os meios necessários para acolher as famílias providenciando casa, trabalho e cuidados de saúde, integrar as crianças na comunidade escolar e dar formação aos jovens, enfim, favorecer uma autêntica integração na sociedade onde todos sejam membros activos e responsáveis com pleno direito de cidadania, com os mesmos direitos e deveres.

A verdade é que a par das muitas e generosas tentativas de integração destes cidadãos vindos de longe, levantam-se cada dia mais vozes que exprimem receios, uns reais outros infundados e um desejo claro de afastar para bem longe este cortejo de desgraça. E não pensemos que são somente as questões económicas que motivam tanta apreensão, talvez ainda mais forte seja o medo do “outro”, daquele que aparece com uma cultura, língua, hábitos, religião diferente da nossa. Esta rejeição do “outro” pode ser, afinal, uma forma de defesa da própria cultura. Por esta razão, tudo o que se tem feito (muito ou pouco) é necessário, mas não basta. É preciso algo mais.

Em 1992 e depois noutras ocasiões o então Cardeal Ratzinger pronunciou-se sobre o tema escaldante da “inculturação” a que ele chama com mais propriedade “interculturalidade”. Ficam algumas ideias: “a inculturação pressupõe a potencial universalidade de cada cultura, em todas elas opera a mesma natureza humana que aspira à união. (...) O encontro de culturas é possível visto que o homem em todas as diferenças da sua história e suas formas comunitárias é único e de uma mesma essência” e acrescenta “A grandeza de uma cultura mostra-se na sua abertura, na sua capacidade de dar e receber, de se deixar purificar e através disso tornar-se mais verdadeira e humana”. Um enorme desafio! Saberemos nós reconhecer as potencialidades das culturas daqueles que recebemos e junto com eles redescobrir e afirmar a riqueza da nossa própria cultura?

Neste Ano da Misericórdia estamos todos convocados para dar pousada aos peregrinos e de modo especial aos perseguidos e refugiados.







Rosa Ventura
professora


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