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quinta-feira, 24 de março de 2016

Iémene: uma geração inteira de crianças abandonada à própria sorte

O alarme é da Save the Children: “Faltam alimentos, remédios e combustível. Todo dia há crianças mortas ou feridas. Os pequenos não vão à escola e muitas vezes são recrutados por grupos armados”

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© Save the Children
“Um ano depois do recrudescimento do conflito no Iémene, quase 90% das crianças do país precisam de ajuda humanitária de emergência. Dez milhões de crianças estão em situação desesperada e largamente ignorada. Uma geração inteira de crianças foi abandonada à própria sorte”. As palavras são de Edward Santiago, director geral no Iémene da organização Save the Children, dedicada desde 1919 a salvar crianças em perigo e proteger os seus direitos. “Ao optar por apoiar a acção militar ignorando as consequências devastadoras para os civis, os governos internacionais estão exacerbando a crise e pondo em risco a vida das crianças”.

“Para milhões deles, o terror dos ataques aéreos e dos bombardeamentos, bem como a destruição de tudo o que os rodeia, já faz parte da vida diária – e não podemos permitir que isso continue”, declara Edward.

Mesmo antes que a crise actual se agravasse, o Iémene já era o país mais pobre e menos desenvolvido do Oriente Médio. Agora, a vida de milhares de crianças está em risco se os combates continuarem e se a entrega de ajuda humanitária vital continuar sendo dificultada.

O relatório “As crianças do Iémene Sofrem em Silêncio”, da Save the Children, explica que um ano de guerra gerou uma crise humanitária das piores do mundo, deixando o país sem medicamentos, alimentos e combustível.

“O médico de um hospital apoiado pela Save the Children em Sana’a nos disse que um recém-nascido morreu no mês passado durante uma queda de energia que desligou as incubadoras. Tinha faltado o combustível necessário para os geradores auxiliares. As outras estruturas de saúde com que trabalhamos estão ficando sem materiais básicos como curativos, antibióticos e iodo. E, nos últimos seis meses, todas viram duplicar ou até triplicar os casos de doenças potencialmente fatais nesses contextos, como a malária, a desnutrição aguda grave, os problemas respiratórios e a diarreia”.

Uma análise recente da equipe de saúde e nutrição da Save the Children na cidade de Saada também identificou a falta crítica de alimentos terapêuticos para crianças desnutridas.

“No Iémene, uma em cada três crianças com menos de cinco anos sofrem de desnutrição aguda. São quase 10 milhões sem acesso a água potável e mais de 8 milhões que não conseguem cuidados básicos de saúde. Cerca de 600 hospitais e centros de saúde tiveram que fechar por causa de danos estruturais ou porque ficaram sem recursos”.

A crise no Iémene teve impacto psicológico devastador nas crianças: estima-se que, todo dia, 6 sejam mortas ou feridas. Em 2015, nos bombardeamentos sobre áreas povoadas, 93% das vítimas eram civis.

“De acordo com uma pesquisa realizada pela Save the Children com 150 crianças em Aden e Lahj, 70% das crianças sofrem sintomas associados a sofrimento e traumas, incluindo ansiedade, baixa auto-estima, sentimentos de tristeza e falta de concentração”, explica Santiago. “Além disso, cada vez mais crianças são recrutadas por grupos armados, raptadas, mantidas reféns e obrigadas a arriscar a vida por causa das milhares de minas que foram espalhadas recentemente”.

Quase metade das crianças em idade escolar no Iémene não tem acesso à educação, já que os ataques contra escolas são em média dois por semana. Mais de 1.600 escolas foram fechadas ou estão sendo usadas ​​como abrigos de emergência para as famílias que se viram obrigadas a fugir da própria casa.

Apesar das enormes necessidades, o plano de resposta humanitária das Nações Unidas para o Iémene só recebeu 56% dos fundos previstos em 2015 e 12% no que transcorreu até agora de 2016 – mas nenhum financiamento foi dedicado até agora à educação e protecção das crianças.

“As nações ricas estão fechando os olhos para o sofrimento das crianças e, em alguns casos, estão fazendo negócios de milhares de milhões de dólares com a venda de armas que continuam a ser usadas contra civis”, denuncia Santiago.

“As resoluções do Conselho de Segurança da ONU são ignoradas em total desrespeito pelo direito internacional e pela protecção de civis, especialmente crianças. É preciso muito mais ajuda para aqueles que sofrem e mais pressão diplomática para acabar com o conflito no Iémene”.

“O cessar-fogo que acaba de ser anunciado poderia ser um passo positivo”, conclui o director da Save the Children no Iémene. “As negociações de paz anteriores não levaram a nenhum resultado substancial e o cessar-fogo falhou. Desta vez, as coisas devem ser diferentes: são as crianças que estão pagando o preço de cada novo dia de conflito. Só se poderá avançar se, desta vez, a prioridade das partes em conflito for verdadeiramente a paz e a solução duradoura”.


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