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quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Misericórdia e família

1. Caminhar juntos
No discurso de encerramento do Sínodo dos Bispos sobre a família o Papa Francisco termina com a seguinte frase, que manifesta abertura e encorajamento: para a Igreja, encerrar o Sínodo significa voltar realmente a «caminhar juntos» para levar a toda a parte do mundo, a cada diocese, a cada comunidade e a cada situação a luz do Evangelho, o abraço da Igreja e o apoio da misericórdia de Deus. Vale a pena deter-se uns momentos a refletir sobre esta frase que resume toda a tonalidade do discurso e desafia toda a Igreja, nas diversas culturas e continentes, a olhar a família com novo olhar e acompanhá-la com uma nova atitude, mais evangélica e solidária.

Em primeiro lugar, o próprio sínodo significa isso mesmo. Os representantes dos bispos de todo o mundo procuram caminhar juntos, afinar o seu olhar e pensamento à luz do Evangelho, da tradição viva da Igreja e sensibilizar-se para a diversidade cultural dos sinodais dos diversos continentes e línguas. Em segundo lugar, num diálogo atento e humilde, tentar diferenciar o essencial do relativo acerca da temática em diálogo, neste caso a vocação e missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo.

Por último, o Papa define uma nova atitude na relação com as famílias feridas ou fracassadas: levar a todos o abraço da Igreja e o apoio da misericórdia de Deus, e não apenas receitas ocasionais sem efeitos de cura, panaceias para iludir as pessoas e as comunidades.

Neste discurso o Papa Francisco retoma a linguagem evangélica de S. João XXIII, que convocou o concílio Vaticano II, não para definir dogmas ou condenar o mundo, mas para incutir esperança e luz à humanidade. Não se trata de negar a doutrina da Igreja e do Evangelho acerca da vontade de Deus sobre a comunidade familiar, mas de assumir a atitude de Jesus para com os doentes e feridos: a misericórdia, que não condena ou exclui, mas cura e salva. Isto mesmo repetiu o Papa Francisco na homilia da Eucaristia conclusiva do Sínodo, a 25 de Outubro, comentando a cura do cego de Jericó, Bartimeu. Jesus ouve o grito do cego, ao contrário da multidão que o seguia e dos próprios discípulos, a quem intima para lho trazer. Esta é a missão da Igreja: escutar, parar, olhar com empatia e ajudar os doentes e feridos a integrar-se na comunidade.

A Igreja não existe apenas para os bons, mas para todos e tem de encontrar caminhos de inclusão na comunidade, de cura, de reconciliação para todos os que desejam e se deixam curar.

Também a Igreja diocesana se encontra em sínodo. No próximo sábado, dia 31, vamos realizar mais uma assembleia com clero, consagrados e leigos, para acertarmos o passo da nossa caminhada comunitária, aprovarmos algumas propostas e entrarmos no último ano do nosso sínodo mais motivados, unidos e apostólicos, levando a boa nova do amor salvífico de Deus a todas as pessoas com quem vivemos.

2. Povo a caminho

Na vasta área da diocese de Beja há muitos montes e recantos dispersos e fora do olhar diário das nossas comunidades paroquiais. Nas visitas pastorais dos bispos procuramos trazê-las para a atenção e cuidado dos responsáveis locais. Por isso, este ano estão a decorrer as visitas pastorais ao concelho e arciprestado de Odemira, a maior área concelhia de Portugal e que abriga realidades muito díspares no contexto das populações do nosso país, desde imigrantes de todos os continentes para trabalhar sobretudo na agricultura até comunidades com identidades e modos de viver diferentes do habitual da tradição alentejana. Na semana passada, D. João Marcos percorreu as paróquias confiadas aos membros da Milícia de Cristo, S. Martinho das Amoreiras, Relíquias, Colos, Santa Luzia, Vale de Santiago e Bicos, aí pernoitando, para contatar com as entidades e instituições, visitar os doentes, reunir com os colaboradores e rezar com as comunidades. 

Em Beja realizou-se, no dia 24 de outubro, a solenidade de S. Sezinando, padroeiro da cidade, a assembleia diocesana do Renovamento Carismático (RCC) e os Professores de Educação Moral e Religiosa nas Escolas (EMRC) reuniram para aprofundar a sua ação durante este ano letivo. Fez parte de ambos os encontros a celebração eucarística presidida pelo Bispo. No final do dia, na igreja de Santa Maria o bispo presidiu a uma solene concelebração da Eucaristia com Vésperas cantadas e a renovação da consagração da cidade a S. Sezinando, assinalando também o quinquagésimo aniversário da morte de D. José do Patrocínio Dias. Assim se caminha e fortalece o peregrinar do Povo de Deus.

Outro momento importante da construção das igrejas locais é a ordenação e entrada solene dum novo bispo e a despedida do anterior. Foi o que aconteceu este fim de semana na vizinha diocese de Setúbal. No dia 25 de outubro, com a participação da maioria dos bispos portugueses e de muitos outros vindos de várias partes do mundo, sobretudo membros da Congregação dos Dehonianos, a que pertence o novo bispo, foi ordenado D. José Ornelas de Carvalho, que foi professor de Sagrada Escritura na Universidade Católica e Superior Geral da sua Congregação durante doze anos. Foi uma grande manifestação de Igreja, Povo de Deus, que acorreu em multidão e muitos ficaram na rua por não caberem dentro da catedral, seguindo a celebração através de grandes plasmas durante mais de três horas. No dia seguinte, a 26 de outubro, na mesma catedral, assinalou-se o quadragésimo aniversário da ordenação do primeiro bispo da diocese, D. Manuel da Silva Martins, com a participação dos três bispos de Setúbal, além do Núncio Apostólico, de muitos outros bispos de Portugal e de muitos cristãos. Assim caminha, cresce e se constrói o Povo de Deus.

† António Vitalino, bispo de Beja




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