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quinta-feira, 23 de outubro de 2014

É possível amar para sempre um príncipe de pantufas e uma princesa maquilhada?

Constanza Miriano fala sobre o recente Sínodo e promove as oportunidades díspares...


Roma, 22 de Outubro de 2014 (Zenit.org) Maria Gabriella Filippi


"O mundo tem as suas catequeses, que são mais poderosas que as da Igreja” e passam por vários canais que nos falam de um amor romântico, de uma simbiose de casais perfeitos... "Mas é possível amar para sempre um príncipe de pantufas e uma princesa maquilhada?", disse Constanza Miriano durante o encontro de ontem à noite sobre a esperança da família. O Sínodo e depois, realizado na Universidade Europeia de Roma. À margem do encontro, a jornalista e escritora respondeu a algumas perguntas de ZENIT sobre o resultado da Assembleia sinodal – que ela acompanhou como jornalista para a RAI Vaticano – e, no geral, sobre os problemas da família de hoje.

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ZENIT: Como você viveu essas semanas do Sínodo como jornalista e como mãe de família?
Constanza Miriano: Não tendo que prestar contas do Sínodo diariamente, estou contente por ter ficado de fora dos mecanismos jornalísticas, que, infelizmente, precisam de notícias, de exacerbar as divisões, de ver tramas e conexões, mesmo onde não existem. Eu, na verdade, até mais do que uma mãe, experimentei o Sínodo como um fiel, confiando na sabedoria dos pastores da Igreja. Apesar de algumas preocupações pelas coisas que ouvi, sempre faço o esforço de lembrar que, apesar de tudo, eles são os pastores e são parte do rebanho. Se tivesse que trabalhar como Vaticanista seria difícil manter esta atitude: eu, pelo contrário, para a Rai Vaticano, lido com os especiais, as coisas que não estão ligadas com a actualidade, portanto, pude manter este olhar de fiel. Estou certa de que a Igreja é guiada pelo Espírito Santo e que não se perderá.

ZENIT: Houve questões que, na sua opinião, poderiam ter sido tratadas mais a fundo?
Constanza Miriano: Como mãe, se eu tivesse que fazer uma pequena observação, destacaria que se falou pouco das crianças, não só do ponto de vista dos divorciados e recasados, mas também no geral; também no discurso sobre casais homossexuais, acho que seja necessário virar a questão do ponto de vista dos fracos, como faria Jesus. Também sobre a questão do aborto, por vezes, nós, na Igreja, nos esquecemos de partir dos mais fracos, das crianças antes do nascimento, não apenas os doentes e deficientes, mas todas as crianças. Com mãe, espero que neste ano o tema da infância seja trazido mais à luz, sem retórica, sem ‘pobres crianças’, mas com a consciência de que elas são o futuro da Igreja e do mundo: se eu fosse um chefe de Estado investiria antes de mais nada na escola, na formação.

Quanto à família, eu acho que hoje em dia, uma assembleia extraordinária sobre família tenha que começar não tanto pelos casos extremos como aqueles dos poucos divorciados recasados, que têm um caminho de fé muito profundo e muitos deles (mas não todos) sofrem pela ausência da comunhão. Parece-me que o grande tema da família de hoje seja, pelo contrário, o significado verdadeiro do amor, oposto ao utilitarista do mundo: o amor cristão se baseia em uma relação de amor com Cristo, que tem muito pouco de emocional e nem sempre é gratificante. Assim, parece-me que um discurso útil para famílias que continuam fiéis à sua labuta diária seja dizer: "Olha que este esforço não é sinal de que tudo está errado, mas é a massa, a matéria com que é feita a vida diária, de amor e da família”; “estamos contigo nesta luta, te ajudamos a levar o peso por uma parte do caminho”, Acho que os cristãos e os pastores tenham que fazer-se irmãos daqueles que se esforçam dizendo que é um esforço bom e não um erro, um esforço que salva e não um acidente. Todos se esforçam. A família do Moinho Branco, onde as coisas funcionam sozinhas, não existe.

ZENIT: A mensagem da media sobre as divisões e conflitos entre os Padres sinodais corresponde à realidade dos factos? 

Constanza Miriano: Acho que os Padres sinodais também são homens, portanto, certamente, às vezes, tem havido entre eles a tentação de alimentar a rivalidade. Porém, acho que, como disseram tantos e como já aconteceu para o Concílio Vaticano II, houve o que realmente aconteceu e o que foi dito, ou seja, o Concílio Mediático, o Concílio de papel: os jornalistas fazem o seu trabalho, mas nós temos que confiar, esperar e saber que a última palavra virá do Papa que é o nosso pastor. Fiz um pouco de jejum mediático, não li muito, não ‘cisquei’ nos sites nesses dias... me irrita quando se fala de progressistas, daqueles que fazem propostas novas, de acordos, de jesuítas de um lado e outros do outro. Em suma, não gosto e acho que não faça bem para a Igreja.

ZENIT: Fala-se muito do óleo da misericórdia nas feridas dos enfermos, da Igreja como “hospital de campanha": qual é a sua experiência de misericórdia na família?
Constanza Miriano: Acho que o amor se pareça muito com a misericórdia, ao perdoar-se mutuamente as próprias imperfeições: enquanto um for homem e a outra mulher, e haja uma profunda diferença e não sobreposição entre masculino e feminino, que a cultura do género quer eliminar, mas que, pelo contrário, é uma diferença fortíssima. Compreender, por exemplo, que a mulher tem necessidade de escuta enquanto o homem está sobrecarregado por seu excesso de comunicação (o homem deve perdoar-nos por não sermos capazes de calar a boca). Amar uma pessoa e uma criatura significa perdoá-la milhares de vezes por ser assim tão limitada, tão falaciosa... O amor é como a Cinderela, a abóbora e o beijo final: acho que, no entanto, o amor entre marido e mulher se pareça com a misericórdia, a olhar com um sorriso para a miséria do outro, e também para as nossas, obviamente, que são diferentes, mas do mesmo peso.

ZENIT: Afastando-se do tema do Sínodo, sabemos que em Roma, nos últimos dias, tem havido transcrição nos registros municipais de uniões do mesmo sexo...
Constanza Miriano: Eu acho que é uma lágrima contra a lei, mas também acho que seja necessário recomeçar dos direitos das crianças, porque todos enchem a boca com a palavra "direitos civis", mas acredito que os homossexuais já tenham a posse de todos esses direitos que, com razão, lhes é negado. O que deve ser negada é a possibilidade de adoptar crianças ou até mesmo de comprá-las com barrigas de aluguel: isto não é absolutamente um direito civil, porque vai contra o direito das crianças de ter um pai homem e uma mãe mulher. Aqui é necessário combater com a própria vida, mas não será necessário, espero que o bom senso vença.

ZENIT: Ouvindo falar de cotas rosas, de incentivos às mulheres (agora as empresas estão dispostas a pagar suas despesas para congelar óvulos e fazerem carreira), você, pelo contrário, diz que é pelas “oportunidades díspares”...
Constanza Miriano:  Eu acho que o mundo do trabalho tenha regras de funcionamento a parte, totalmente masculinas, e que nós mulheres, apesar de tanto feminismo, lutamos para entrar neste mundo do trabalho, onde sofremos bastante porque, se queremos avançar no trabalho temos que ‘amputar’ a nossa vida pessoal ou, em alternativa, fazer sofrer as pessoas que nos foram confiadas; se, pelo contrário, queremos investir nas pessoas queridas, temos que renunciar o trabalho (que pessoalmente eu renunciaria também, mas nem sempre é possível fazê-lo, ou melhor, quase nunca). Teremos que lutar para que o mundo do trabalho esteja na medida da mãe e da mulher (embora mesmo as que não são mães sempre são mães daqueles que lhes foram confiadas, porque assim está escrito no coração da mulher). Como sempre, as batalhas feministas partem de uma exigência justa, mas logo em seguida adoptam lógicas masculinas e erram no objectivo, portanto, gostaria de buscar as “oportunidade díspares” e adoptar discriminações que estejam a nosso favor.

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